BRASIL; Romanização

De Dicionário de História Cultural de la Iglesía en América Latina
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Termo impropriamente usado como sinônimo da reforma eclesial levada a cabo durante o Segundo Império (1842-1889) ou da reestruturação da Igreja no Brasil ao longo da República Velha (1889-1930), quando não de ambas, tem uma origem européia. O autor desse neologismo foi Johann Joseph Ignaz von Döllinger (1799-1890), padre, historiador e teólogo alemão, opositor declarado da definição da infalibilidade papal. Em 1869, com o pseudônimo de “Janus”, ele publicou a obra Der Papst und das Concil (O Papa e o Concílio), onde denunciava que “o ideal da Igreja para os ultramontanos é a ‘romanização’ de cada igreja particular e possivelmente a supressão de toda vida própria das igrejas nacionais”.

Döllinger acabou sendo excomungado em 1871, mas, o seu pensamento foi apropriado pelo baiano Rui Barbosa de Oliveira (1849-1923), que dele se serviu para tentar justificar a submissão da Igreja ao regalismo brasileiro. Ele fez isso ao acrescentar no início da tradução da obra mencionada, uma grande introdução, onde usou livremente o conceito “romanização” em chave jurisdicionalista. Era o ano de 1875 e o Grão-mestre maçom Joaquim Saldanha Marinho, ao tomar conhecimento do fato, ofereceu ao seu ator a quantia de cinqüenta contos de réis, mais a promessa de adquirir mil e quinhentos exemplares para a sua loja maçônica, a fim que a mesma fosse publicada.

Rui prontamente aceitou e no ano seguinte, depois da recusa de algumas editoras em imprimi-lo, o livro foi lançado no Rio de Janeiro pela Brown e Evaristo, causando surpresa pela virulência da linguagem do tradutor na citada introdução que fez, onde atacava rijo o pontificado romano e o que chamava de “trevas ultramontanas”. Particular crítica também mereceu o novo dogma contido na Pastor Aeternus; mas, o inteiro processo de mudança eclesial ocorrido no Brasil e noutros países foi igualmente alvo de comentários mordazes: “Não houve talvez, antes da sua recente romanização (o grifo é nosso), um sínodo importante que ali não afirmasse a subalternidade dos papas à autoridade do Concílio Geral. [...] O episcopado abdicou é certo, afinal, à consciência e o dever aos pés do ídolo ultramontano. [...] A primeira conseqüência dessa nova fase é a absorção da Igreja pelo papado”.

Mais tarde, Rui se reconciliou com o Catolicismo, recusou de lançar uma segunda edição de O Papa e o Concílio, nunca mais reutilizou o termo “romanização” e fez uma sincera confissão de culpa: “Escrevi isso (O Papa e o Concílio) no início da minha vida para manter minha mulher. O Saldanha Marinho me prometeu cinqüenta contos, que seriam uma fortuna para mim. Tive castigo imediato, dado que o Saldanha não me deu nada”. Ele foi além e no jornal A Imprensa, retratou-se publicamente do que escrevera: “O juízo da mocidade cedeu em nós à reflexão da idade madura. [...] Não hesitamos em rejeitar aquele parecer como exageração lógica e erro de inexperiência, a que nos congratulamos por ver-se opor-se ainda agora, em imponente maioria, a Câmara dos deputados”.

O conceito “romanização”, ainda que com novas nuances, reapareceu décadas mais tarde, nos estudos do sociólogo francês Roger Bastide (1898-1974) e nas obras do historiador estadunidense Ralph della Cava. Em seguida, sob influência destes, outros estudiosos o utilizaram, coisa que prossegue até os nossos dias. Acrescente-se que, “romanização”, ressalva feita às óbvias diferenças históricas e de conteúdo, possui também vaga analogia com “romanismo”, outro célebre vocábulo, cunhado por alguns cultos reformados para se referirem ao Catolicismo. Também neste caso a origem é alemã, dado que foi Martinho Lutero quem, em 1520, no seu manifesto À nobreza cristã da Nação Alemã, acusou o que entendia serem as muralhas defensivas dos “romanistas”.