BRASIL COLONIAL

De Dicionário de História Cultural de la Iglesía en América Latina
Revisión del 22:27 6 feb 2018 de Vrosasr (discusión | contribuciones) (Protegió «BRASIL COLONIAL»: Página muy visitada ([edit=sysop] (indefinido) [move=sysop] (indefinido)) [en cascada])
Ir a la navegaciónIr a la búsqueda

Prólogo

O processo de transformação do habitat humano, de acordo com a cultura e as necessidades humanas, transformaria uma porção de terra no centro oriental da América do Sul. A terra de Luzia, terra de exuberante beleza natural e palco de forma de vida primitiva, não seria mais a mesma depois da chegada dos portugueses no ano de 1500.

A narração da carta de Pedro Álvares Cabral, traria ao conhecimento do mundo civilizado a exuberância da terra e a existência de vida primitiva. Mas, se este escrevesse uma carta anos depois, certamente narraria toda a transformação provocada pela ação dos homens civilizados. De certo, o homem descrito não seria mais aquele desprovido de astúcia, gozador de plena liberdade, mas contaria a história de homens adestrados para o trabalho e a servidão.

A ingênua nudez primitiva ganharia adornos, e que adornos estes senão a ganância e a altivez. A narração certamente traria ao conhecimento do mundo que a terra não seria mais completa, com suas gigantescas árvores de cor avermelhada ou aquelas produtoras de saborosas frutas que alimentavam o povo local.

Mas dariam o seu espaço no solo para que o homem pudesse produzir as suas mazelas e fortuna. Desta forma, não somente a terra sofreria as suas transformações, mas o ser humano seria transformado em servo de uma ganância exacerbada da nova gente «civilizada».

Estrutura administrativa colonial

Apesar da descoberta de uma grande e vasta área territorial, o Brasil, que primeiramente foi chamado «Terra de Santa Cruz», viveu metade de um século à mercê dos saqueadores, principalmente os franceses e ingleses, que constantemente contrabandeavam o pau-brasil. Os portugueses mantinham, a princípio, pequenas expedições de reconhecimento territorial e uma forma ineficaz de proteção. Sua visão estratégica comercial voltava-se inteiramente em direção às Índias orientais.

Após 1532, com as constantes invasões e saques, resolveu o então rei de Portugal D. João III enviar ao Brasil uma expedição de colonização, que protegeria o território e criaria um novo espaço de desenvolvimento comercial para a coroa. O responsável da expedição foi Martim Afonso, que desembarcou em São Vicente.

O plano posto em prática foi de dividir a região em pequenas partes, entregando-as a quem tivesse condições de plantar e fazê-las prosperar. Este processo conhecido como sesmarias permitiu, em um curto espaço de tempo, um maior aproveitamento do espaço, e com isto desenvolveria a agricultura local que até então se baseava exclusivamente na pequena plantação de alimentos de subsistência.

Martim Afonso instalaria na região o primeiro engenho de produção de açúcar, o que daria uma rápida ascensão ao plantio da cana-de-açúcar, carro mestre da economia colonial, e consequentemente aumento do comércio e fluxo de navegação na costa.

Foram instituídas, a partir de 1534, quinze capitanias, que visavam principalmente o desenvolvimento e povoamento da nova terra. A função básica das capitanias hereditárias, era de criar meios necessários para que cada região, de acordo com sua área, fosse capaz de se transformar e desta forma povoar a terra, desenvolver o comércio no Atlântico sul, e proteger a terra contra os invasores.

Na realidade, as capitanias tiveram grandes problemas para atingir o seu objetivo: 1. O maior problema enfrentado pelos donatários era a rejeição da população nativa que constantemente atacava os colonos, recusando-se a dividir o solo que sempre lhes pertenceu; 2. As constantes intrigas que se formavam entre os próprios donatários; 3. Os constantes ataques sofridos pelos saqueadores estrangeiros. Das capitanias instituídas, as que tiveram os maiores êxitos foram as de São Vicente, Bahia e Pernambuco.

Com a precariedade em algumas das capitanias, resolveu a coroa portuguesa estabelecer uma nova forma de governo, visando o impulso e a unidade da terra colonial. Desta forma criou-se o governo geral no ano de 1548, sendo o seu primeiro governador Tomé de Sousa, que governou até 1553. Fundou-se, com a sua chegada, a cidade de São Salvador, na Bahia de Todos os Santos, que se tornou a capital da colônia.

Além do governador, criavam-se outros cargos: 1. Ouvidor geral para distribuir a justiça; 2. Provedor mor para os negócios da fazenda; 3. Capitão mor; 4. Escrivão para a alfândega, provedoria e defuntos; 5. Mestre de obras para as fortalezas, artífices, oficiais mecânicos, etc. Juntamente com o governador e demais funcionários da coroa portuguesa, chegaram trezentos homens para a guarnição, quatrocentos degredados e trezentos colonos, que teriam como função organizar a vida na colônia, estabelecendo as leis e fazendo-as cumprir.

Além destes, chegaram no tempo do governador às órfãs da metrópole que recolhidas pela rainha D. Catarina, tinham o objetivo de se esposarem com os colonos a fim de prosperar a população na colônia. Estas novas famílias dariam início aos troncos familiares portugueses no Brasil colonial.

Após Tomé de Sousa, governaram a terra colonial D. Duarte da Costa no período de 1553 a 1558. Seu governo foi marcado pela entrada no interior da colônia, no intuito de explorá-la, partindo da terra de Porto Seguro. Sucede-o no ano de 1558, Mem de Sá, governando até o ano de 1572. Em seu governo sofreu a terra colonial duros ataques por parte dos franceses que, com o apoio dos indígenas, saqueavam a madeira do pau Brasil para comercializá-las na Europa.

Não mediu esforços para povoar a terra do Rio de Janeiro, no trecho que se localiza do morro do Pão de Açúcar até o morro de São João (conhecido anteriormente como morro do Cão), o intuito era proteger o Rio de Janeiro.

No ano de 1573, o rei de Portugal resolveu dividir a administração colonial em dois governos, uma para o norte, com sede na recém-criada São Salvador, e outro para o sul, com sede no Rio de Janeiro, tentando organizar a vida daquela localidade. O sul do país já vivia um tempo de prosperidade e organização, não livre dos constantes ataques franceses.

O Rio de Janeiro se destacava pela prosperidade e desenvolvimento comercial, atraindo para a região um grande número de colonos, que chegavam no intuito de fazerem riqueza. Já ao norte, ainda restava o desafio da conquista, exceto a Bahia e Pernambuco, o restante sofria de carência populacional e com a falta de investimento comercial.

Com este processo de desigualdade, se viu o rei de Portugal obrigado a recuar nos seus planos políticos para a colônia. Com isto, em 12 de abril de 1578, apenas cinco anos depois da criação do governo bipartidário, volta-se ao sistema de um governo único para a colônia, que marca o restante do tempo da administração colonial.

Além do governo geral, faziam parte da administração colonial: 1. Secretaria de Estados e Secretária real: encarregavam-se dos negócios gerais do governo real; 2. Casa da Índia: responsável por todos os negócios ultramarinos, que vai desde a nomeação dos funcionários até a promulgação dos regimentos gerais e alvarás individuais; 3. Vedores da fazenda: era vinculada à casa da índia e responsável pelas atividades de feitorias, venda de mercadorias recebidas além mar, manutenção das mercadorias e remessa das armadas; 4. Mesa de consciência e ordens: era de sua jurisdição opinar em matéria eclesiástica em que havia a necessidade da intervenção real, além de ser responsável também pela administração das ordens militares.

Além destas funções gerais, eram ainda de responsabilidade da mesa: conhecer os negócios e papéis da provedoria-mor dos que morressem fora do reino, conhecedora dos negócios dos ministros e tesoureiros gerais nas diversas colônias, ser conscientes dos negócios das três ordens, conhecedora de tudo que tangia à provedoria dos cativos e seus resgates e bem como à arrecadação da fazenda dos vassalos que falecessem fora do reino, e ter consciência das coisas espirituais que os prelados do ultramar escrevessem ao rei, e que fosse necessário darem resposta;

5. Conselho da fazenda: passou a substituir a partir de 1591 os antigos vedores da fazenda real. Era dividida em quatro seções com as tarefas de: dirimir os negócios do reino, das colônias e das ordens militares e de dirimir os negócios das colônias africanas. Foi instituída a sua função em 1604 a direção do comércio colonial e o recebimento das rendas que advinham da Guiné, Brasil e ilhas do Atlântico;

6. Conselho da Índia e conquistas: Eram de sua competência todas as matérias e negócios de qualquer natureza, tocantes aos Estados da Índia e do Brasil e mais domínios ultramarino. Resultou desta forma a verificação de que não convinha misturar os negócios coloniais aos da metrópole. Ainda eram de sua responsabilidade os provimentos de todos os bispados e ofícios da justiça, fazenda e guerra;

7. Conselho ultramarino: era responsável pelos negócios dos Estados da Índia, Brasil, Angola e mais conquista do reino, e tudo aquilo ao qual se pudesse dilatar que nestas localidades se possuía. Competia-lhe ainda a consulta das naus e navios que deviam ir às conquistas, o reconhecimento dos negócios da guerra, e conselheira nos negócios de resolução régia com relação às colônias. No ano de 1647, criou-se a Companhia geral do comércio para o Estado do Brasil.

Comércio colonial

A preocupação comercial portuguesa no início do século XVI se restringia apenas ao desenvolvimento e consolidação do comércio de especiarias com as Índias Orientais que lhe rendia um vultoso espaço comercial na Europa. No princípio do processo de colonização, o interesse português para com a colônia se restringia somente ao extrativismo do pau Brasil e ao comércio das curiosas espécies exóticas, como papagaios e outras aves, que faziam parte do habitat natural.

O extrativismo e comércio do pau-brasil poderiam render a Portugal uma quantia considerável, sendo que o mesmo era muito procurado pelos Orientais, dada a sua utilidade para tingir os finíssimos tecidos que naquela região eram fabricados. Além do mais, a cor vermelha, símbolo da realeza, era a mais solicitada pela sociedade da época que procurava no simbolismo da cor agregar-se à nobreza.

O rei de Portugal, D. Manoel, declarou no ano de 1501 o pau-brasil como monopólio da coroa, e entendeu por bem arrendar a extração a um nobre mercador português, Fernão de Loronha, que tinha como obrigações com a coroa portuguesa o pagamento de vinte por cento sobre o comércio da madeira e a instalação de fortalezas e defesa territorial no Brasil.

O processo de arrendamento durou pelo período de três anos, e no ano de 1504 o concessionário desiste visto as dificuldades enfrentadas com os índios e os constantes ataques e saques que advinham dos contrabandistas.

Com as terras brasileiras desguarnecidas de proteção, os franceses, principais interessados na exploração e comércio do pau-brasil efetuaram grandes investidas locais. O francês, diferentemente do português, procurou manter uma boa amizade com os habitantes locais, e assim assegurar com eles um aliado que fosse capaz de ajudá-los na exploração.

Em troca, os franceses concediam aos indígenas produtos que por eles eram ambicionados. Além do mais, os franceses procuravam demonstrar aos indígenas apenas interesse na exploração extrativista e não na possessão da terra.

O Rei de Portugal, D. João III, exerceu certa pressão junto à corte francesa para que cessassem a extração do produto em terras portuguesa, em virtude dos grandes prejuízos aos cofres nacionais. O trabalho diplomático português teve respaldo por algum tempo. O processo de capitanias hereditárias, que gerou a divisão da terra, é que geraria uma relativa proteção da terra e a diminuição da extração clandestina da madeira.

O lucro com o comércio do lenho para a corte portuguesa não representava 5% da receita total da corte, o que lhe causava certo prejuízo, visto que o erário não poderia cobrir nem ao menos os custos com a defesa e o comércio da madeira, o que resultou muitas vezes na falta de interesse por parte da coroa na vigilância costeira.

O produto por excelência no sistema comercial colonial foi o açúcar, este ocupou o centro nevrálgico da economia colonial nos dois primeiros séculos. A chegada das primeiras mudas de cana-de-açúcar iria transformar de forma substancial a vida da colônia, e colocar em prática o projeto de desenvolvimento pleno das terras portuguesa.

A partir da segunda metade do século XVI, a expansão canavieira foi ocupando todas as capitanias. Apesar do sul do país ter se desenvolvido rapidamente no processo produtivo com a construção de vários engenhos e com investimento estrangeiro, o centro da atividade produtiva no Brasil se concentrou basicamente no nordeste . A rentabilidade da coroa com o comércio do açúcar começava a ganhar grandes proporções, com isto resolveu a coroa portuguesa estimular a plantação da cana-de-açúcar e a implantação dos engenhos. A região escolhida para uma maciça construção das fábricas de açúcar seria o Recôncavo Baiano, devido às condições climáticas e pluviométricas, propícias para o plantio.

O projeto da coroa portuguesa começa a alavancar e ganhar pleno êxito na região do Recôncavo Baiano a partir de 1570; nesta época já se contava com um número de dezoito engenhos, no ano de 1590 já existiam em pleno funcionamento um número em torno de quarenta a cinquenta engenhos.

Se na Bahia as instalações não paravam de crescer, em Pernambuco as coisas não eram diferentes. O padre Fernão Cardin declarava que existiam nesta época cento e quinze engenhos no Brasil, sendo sessenta e seis deles somente em Pernambuco. No ano de 1612 o Brasil contava com um número de cento e noventa e dois engenhos, sendo cento e setenta deles localizados no litoral do nordeste. Por volta do ano de 1638, o número deles subia para trezentos e quarenta e seis.

Os primeiros engenhos não tinham grande potencial técnico, o açúcar era fabricado basicamente de forma artesanal, as moendas eram movidas por cavalos ou bois, apenas alguns eram movidos por força hidráulica, de modo que os próprios proprietários desenvolviam a engenhoca necessária para o movimento.

Alguns anos mais tarde, por volta do início do século XVII, já se podiam notar as grandes transformações nestas engenhocas, isto devido aos grandes investimentos técnicos que foram sendo implantados. Agora era a falta de cana-de-açúcar que preocupava os produtores.

Para suprir esta necessidade, os próprios proprietários começaram a conceder parte de suas terras a pequenos agricultores que plantavam e entregavam ao senhor da terra a produção. Começava a ganhar força na colônia o pequeno produtor e, com ela a diversificação e aproveitamento de produtos. Com a expansão da terra cultivada, a produção açucareira se desenvolvia e o lucro com a venda do produto na Europa era transformado em investimento. Estima-se que já no final do século XVI a colônia contava com cento e vinte engenhos de açúcar, e que os mesmos produziam um total de dois milhões de toneladas de açúcar-ano. No século XVII, o açúcar encontra a sua grande expansão no mercado Europeu devido à alta de consumo.

O Brasil, como grande produtor, conquista o mercado, e conferia aos cofres portugueses uma fortuna que superava aos ganhos com o comércio das Índias Orientais. A prosperidade causada pela produção e comércio do açúcar foi a porta de entrada definitiva dos europeus nas terras do Brasil.

Com o advento dos engenhos de açúcar se fez necessária a presença da força animal, tanto para a produção (visto que o mesmo era produzido de maneira artesanal e o animal era necessário para a tração de moendas) como para o transporte. Desta forma, outro mercado se abria dentro da colônia, era o da criação de gado.

O bovino foi introduzido na colônia por intermédio de Anna Pimentel, esposa de Martim Afonso de Souza, da capitania de São Vicente, que no ano de 1534 o importa. Proporcionalmente ao crescimento do número de engenhos, crescia também a criação de gado, que ganhou força com a escassez de madeira na região, fator que se agravava à medida que crescia o número de instalação de grandes engenhos na região litorânea.

Isto forçava os produtores a buscarem o produto no interior das matas e o transportar até os engenhos. Esta necessidade do transporte geraria por parte de pequenos proprietários rurais o investimento na criação do animal. Dentro deste cenário, o gado bovino encontrou o seu pleno desenvolvimento.

Os currais nos quais eram criados, não se restringiam à mesma área dos engenhos de açúcar, visto que não era permitida pela coroa a criação nas proximidades das áreas às quais se dedicava o plantio de alimentos. O gado encontrou, então, o seu espaço no interior da colônia, abrindo assim novos territórios antes não ocupados e, como a criação de animais não requer um solo adequado, a terra utilizada para sua criação era de baixa qualidade, e localizavam-se muito distante das culturas que necessitavam de um bom solo.

Acredita-se que havia em torno de treze mil pessoas que se dedicavam à criação de gado, com um número em torno de seiscentos e cinquenta mil cabeças, isto no início do século XVII. O comércio bovino era praticado pelas vendas das cabeças aos senhores de engenho, ou na comercialização internacional do couro, que era utilizado na Europa para diversos fins.

Outros foram os produtos que fizeram parte do comércio colonial brasileiro, dentre eles o tabaco e a cachaça. O tabaco era destinado aos mercados europeu e africano, sendo que na África foi também utilizado como moeda de troca na compra de escravos negros. As grandes áreas produtoras de tabaco foram Pernambuco, Pará, Maranhão, Bahia e Minas Gerais.

Já a cachaça era produzida a partir do refinamento do açúcar que, com a destilação do melaço, se chegava à produção da bebida. Era em geral produzida por pequenos engenhos, principalmente na região do Rio de Janeiro. Seu consumo preponderava principalmente em meio aos escravos e pessoas de baixa renda, mas acabou atingindo o mercado internacional, onde os habituais consumidores de vinho começavam a trocar a bebida pela advinda da colônia, o que fez com que a coroa portuguesa proibisse a entrada do produto no mercado para não afetar o mercado vinícola nacional.

A mão de obra no Brasil colonial

A relação do homem português recém-chegado com o habitante local se baseou a princípio em uma convivência fraterna. De um lado, o total desconhecimento da terra à qual se desembarcava fazia daqueles navegadores reféns dos habitantes locais, que por sua vez eram plenamente conhecedores da geografia e dos perigos que esta poderia oferecer.

Desta forma, as primeiras relações foram de forma amigável, o português procurava aos poucos adquirir a confiança do indígena. Já nos primeiros contatos o português percebeu o espanto e curiosidade dos indígenas com os objetos que adornavam ou traziam consigo os homens europeus.

Atentos ao interesse dos índios pelos adornos portugueses deduziu-se que uma forma para adquirir o conhecimento necessário sobre a terra, era envolver o índio em um sistema de troca, ou seja, o português oferecia a estes pequenos presentes, que variavam de espelhos a serrote, e em troca obteriam deles o conhecimento geográfico da terra, das riquezas e principalmente o trabalho servil. Instaurou-se assim o primeiro sistema comercial na terra brasileira, ou seja, o escambo.

O pau-brasil foi o primeiro produto nacional exportado para Europa, e desta forma o índio foi a primeira mão de obra efetiva na recém-descoberta terra. Fatores para a manipulação do índio não faltaram aos portugueses. A mão de obra era de baixo custo, o índio tinha um corpo aparentemente capaz de suportar o trabalho pesado, e por último conhecia a terra; e, portanto atraente para os negócios dos exploradores portugueses.

Mas esta forma de relação de escambo produtivo durou por pouco tempo. Primeiramente o índio não era acostumado ao trabalho forçado, gozava de sua liberdade e não tinha o conhecimento do acúmulo de capital, por isto a ele não interessava nenhuma relação de trabalho ou comercial, não lhe interessavam leis que pudessem regê-los; ao mesmo tempo a invasão de suas terras por parte dos portugueses já causava grande descontento; além de que já eram plenamente satisfeitos pelos objetos oferecidos pelos portugueses, visto que isto não lhes interessava.

Diante dos trabalhos impostos e da violência portuguesa, o índio começou a abandonar o sistema de exploração servil. Neste momento, o português usou de uma arma plenamente conhecida dos europeus: a escravidão. No ano de 1511, apenas onze anos após a chegada dos portugueses já se informava da presença de índios escravizados.

O português fomentou a guerra entre as diversas tribos, procurando fazer com que os mesmos capturassem seus inimigos e os trocassem com os portugueses. Outra forma de captura era através da recusa que os índios faziam em servir e respeitar o governo português, com isto eram automaticamente aprisionados e transformados em escravos. Também o ato do canibalismo tornou-se motivo para aprisionar o indígena.

As reduções, foram outro instrumento muito utilizado pelo colonizador, estes entravam sertão afora em busca dos índios, e aqueles que se recusavam eram presos e transportados para serem escravizados sobre a acusação de desobediência. Com isto, muitas famílias foram destruídas e tribos inteiras aniquiladas, algumas famílias eram inteiramente levadas ao cativeiro.

Algumas mulheres eram consideradas hábeis a fabricação do açúcar e utilizadas dentro dos engenhos. A constante luta pela liberdade fazia com que os indígenas mais resistentes à colonização atacassem os portugueses; desta forma, muitas vezes, a força do homem europeu munido de armamentos vencia a ingenuidade e despreparo da população indígena.

Uma luta sangrenta se instalou na colônia em consequência da ocupação do solo e pela obtenção da mão de obra . Outros se rendiam por medo e cooperavam com a campanha portuguesa. No ano de 1551, Padre Manoel da Nóbrega, preocupado com a ação portuguesa, informava em carta ao padre geral da ordem sobre a presença de escravos indígenas no Brasil.

Com a instalação do ciclo açucareiro no Brasil, a escravidão indígena começava a ganhar grande força. Os senhores de engenho tinham necessidade de mão de obra qualificada para o mesmo, estes que vieram da Europa e eram profundos conhecedores da prática produtiva, mas da mesma forma havia a necessidade para a mão de obra desqualificada, aquele que serviria de base para a plantação, colheita, e no auxílio da produção do açúcar. É neste cenário que a presença do indígena era importante . Os escravos indígenas foram tratados com severidade, e impostos a eles trabalhos pesados e humilhantes, insuportáveis à sua condição física. Este excesso de trabalho, em contrariedade ao modo de vida indígena, fez com que fossem vistos como preguiçosos e desinteressados do trabalho. Muitos foram aqueles dizimados pela fatiga do trabalho, outros ainda, pelo contato com o homem branco, acabaram morrendo pelas epidemias, que anteriormente não os atingiam.

O índio também foi o auxiliar dos chamados bandeirantes no desbravamento das terras no interior do Brasil, principalmente na região de São Paulo e sul da colônia. Entravam juntamente com o homem branco abrindo as trincheiras para passagem de um mundo novo que abrigaria a prosperidade e a modernidade. No sul do Brasil, a escravidão indígena encontrou um menor espaço, tendo sido a presença de alguns portugueses nesta parte do Brasil, como João Ramalho, que conscientizavam os índios da importância de cooperação na exploração de suas terras.

O indígena cada vez mais acuado entrava mata adentro, deixando as regiões costeiras a cargo dos habitantes das colônias que advinham da terra europeia. Esta parte do país tinha agora outro destino, os grandes engenhos de açúcar que tomavam o lugar onde anteriormente o índio vivia sua plena liberdade, vivia a fraternidade e o cotidiano de suas raízes.

Depois da passagem do europeu, a paisagem se transformava não mais se podia visualizar e deslumbrar as belezas naturais, mas agora o homem vislumbrava os grandes navios que acostavam no litoral brasileiro em busca do açúcar e demais riquezas da terra, que tinham como destino a Europa. A beleza das cabanas indígenas dava lugar aos grandes latifúndios de produção açucareira.

O arco e flecha eram substituídos pela força braçal da produção do açúcar e demais produtos que agora faziam parte da vida local. As terras anteriormente habitadas pela fauna e flora davam espaço às edificações em estilo português que transformavam o espaço naturalista em espaço arquitetônico. As índias, que na sua exuberância feminina circulavam livremente pela terra, agora eram substituídas pelas senhoras da burguesia do açúcar que tomavam conta das passagens das vilas. Após a chegada dos primeiros missionários ao Brasil os índios foram submetidos à fé católica, o que representava para a coroa portuguesa uma forma de manter a ordem social. O índio que não se esquivasse aos atos de fé da religião da coroa era então considerado rebelde, subversivo, e então tinha como seu destino a escravidão, desta forma, era obrigado à catequese e participação aos ritos da Igreja e ao trabalho.

A escravidão indígena, que perdurou pelo Brasil duramente por dois séculos, encontrou o seu eco de luta em prol da liberdade, seja por parte da Igreja, ou pela própria coroa. Das ordens religiosas presentes no Brasil neste tempo, Padre Antônio Vieira, membro da companhia de Jesus, se tornaria um grande defensor em prol da liberdade indígena. As constantes insurreições que surgiam por parte dos colonos contrários à liberdade dos indígenas se tornavam um grande entrave para o governo colonial, e criava constantes choques entre os missionários religiosos e colonos.

De um lado a defesa pela liberdade, do outro a manutenção da escravidão como necessidade para a manutenção do processo produtivo a um custo baixo, e enriquecimento fácil. O índio não se tornou a única fonte de mão de obra para a economia colonial. Já no princípio da colonização desembarcavam os primeiros negros advindos do continente africano e que viriam para suprir a necessidade de trabalhadores, principalmente na produção de açúcar.

A mão de obra negra era proveniente principalmente das regiões que vão do Senegal a Angola, e serviam para abastecer o mercado de escravos negros da Holanda, Portugal, Inglaterra e Brasil. Com o descobrimento das novas terras e a necessidade do desenvolvimento econômico dos principais países colonizadores, a mão de obra africana se tornou garantia de força humana para a execução de ciclos produtivos.

Esses negros eram capturados em suas terras pelas constantes lutas política e religiosa, e assim transformados em prisioneiros de guerra e, consequentemente, vendidos como escravos.

O comércio negreiro que atendia as necessidades das grandes nações da época fundamentava-se, ao menos em grande parte, nas relações de trocas comerciais, ou seja, em troca do negro, os mercantes ofereciam aos seus proprietários os mais diversos produtos: cavalos, armas de fogo e munições que advinham preponderantemente do mercado europeu. Na América, a moeda de troca se baseava em: açúcar, aguardente, doces e até búzios.

O mercado negreiro encontrou pleno êxito e liberdade na colônia, a coroa portuguesa não impedia às grandes transações negreiras, ao contrário, a comercialização gerava ganhos diretos como qualquer outra transação comercial. A princípio, a coroa instituiu apenas uma pequena taxa por cabeça de negro transportado para o Brasil, mas a partir de 1697 com a crescente entrada de negros, o governo monopoliza o trafico, e passa a privilegiar algumas das companhias de comércio presentes na colônia, como a do Maranhão e a do Grão Pará.

Estima-se que desembarcaram no Brasil no século XVI em torno de cem mil escravos negros, já no século XVII em torno de seiscentos mil, sendo que este número atingiria a marca de um milhão e trezentos mil no século XVIII. A partir do século XVII, os portugueses perdem o monopólio sobre o comércio negreiro, sendo entregue pela coroa espanhola aos mercantes holandeses e posteriormente aos ingleses.

No Brasil, os escravos africanos chegaram a partir do ano de 1535 a São Vicente, apesar da autorização para a importação da mão de obra negra acontecer somente em 1549. Desta forma, o mercado de negros passa de um processo de pirataria e entra em uma fase oficial, ou seja, mercantil. Os negros que chegaram ao Brasil foram primeiramente empregados em trabalhos domésticos e somente posteriormente foram formados para o trabalho nos engenhos ou nas demais culturas colonial.

A grande explosão de entrada de negros no Brasil se dá justamente quando começaram a desenvolver os grandes engenhos de açúcar, principalmente na costa nordestina. Foram os portos da Bahia e Pernambuco que receberam em grande número os homens e mulheres advindos da África.

O momento de maior desembarque dos negros coincide com um grande movimento em prol da libertação do indígena; ganhavam força as campanhas ideológicas que apoiariam a libertação do indígena, apoiadas na base pelos humanistas que tinham como cunho a Igreja. Por outro lado, quem ganhava espaço eram os traficantes negreiros, que com o minguar da mão de obra indígena e o constante descontentamento com ela, eram procurados pelos senhores de engenho. Isto geraria um fluxo grande de entrada de negros.

A tudo isto vem somar o apoio da coroa e da igreja que procuravam proteger o indígena, dando ampla dimensão de apoio a essas companhias de comércio escravo, que por sua vez impediam a comercialização do índio escravo em seu espaço de atuação. Com isso, a luta pela extinção da escravidão indígena ganhava um novo aliado, não que se importasse com a condição humana do índio, mas o seu objetivo era apenas o de desenvolver o seu comércio, gerando grandes ganhos financeiros.

O comércio de negros, principalmente para a América, se tornaria um dos negócios mais lucrativos no período colonial, chegando a propiciar ao comerciante uma soma que poderia chegar a trezentos por cento de lucro sobre o escravo vendido.

Nos engenhos de açúcar o escravo negro era empregado nos trabalhos manuais que requeriam a força física, por isto, em geral, eram requisitados os negros jovens e de grande potencial físico. O negro era obrigado a uma dura jornada de trabalho em que o poder dos senhores, é que ditava o ritmo dos trabalhos, e sua jornada de trabalho se estendia da aurora ao anoitecer. O escravo era assim coagido à força ou à violência a executar o trabalho a ele auferido, a ele restava somente o título de capital investido agregado à produção com o qual deveria corresponder.

Os africanos que chegavam ao Brasil pertenciam às áreas culturais de grande desenvolvimento. Em geral eram mestres por formação, executavam os trabalhos de artesanato, técnico para minas, artífice em ferros, conhecedores de técnicas pastoril, comerciantes de pano e sabão e por fim mestres e sacerdotes maometanos. As mulheres escravas que serviam a casas dos senhores eram conhecedoras de técnicas da culinária africana. O africano foi o responsável pelo desenvolvimento da agricultura, pecuária e da mineração, tornando-se assim o grande expoente do desenvolvimento técnico do Brasil colonial. Foram diversas as insurreições dos negros, que, inconformados com o tipo de vida e o trabalho ao qual eram submetidos se rebelavam contra os seus senhores. Assim, a fuga para campos distantes era uma constante na vida das senzalas. Estas fugas em geral eram precedidas de atentados contra a vida dos senhores ou dos feitores da fazenda. Os negros que fugiam formavam comunidades denominadas quilombos, onde, longe da vida das senzalas, se organizavam de forma livre e unicamente voltada à sobrevivência.

Viviam agrupados nas senzalas, e eram constantemente vigiados para que se evitassem as fugas ou rebeliões. Costumeiramente os negros que não correspondiam às ordens da casa grande ou tentavam a fuga, eram castigados de forma brutal nos pelourinhos, ou nas próprias fazendas com o açoite. Distante da sua família, da sua terra, o negro escravo vivia uma vida sofrida, e não lhe restavam senão os dissabores da vida. Nos pequenos atos comunitários, como a expressão religiosa ou cultural, o negro tentava se aproximar da sua vida que ficou para trás, recordando da sua gente e da sua terra.


NOTAS

BIBLIOGRAFÍA

ALBUQUERQUE M. M. DE, Pequena história da formação social brasileira 4ª ed., Rio de Janeiro, Graal, 1986

BEOZZO, J. O., Leis e regimentos das missoes politica indigenista no Brasil, São Paulo, Loyola, 1983

CARDIM, F., Tratados da terra e gente do Brasil, Belo Horizonte, Itatiaia, 1980

COSTA, E. V. Da, Da Senzala a Colonia, 4ª ed., São Paulo, Fundação editora da Unesp, 1998

FERLINI, V., Terra, Trabalho e Poder o mundo dos engenhos no Nordeste colonial, Bauru, Edusc, 2003.

FREYRE, G., Casa-grande & Senzala, 13ª ed., Brasilia, Editora Universidade de Brasilia, 1963

FURTADO, C., Formação Economica do Brasil, 12ª ed., São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1974

GILBERTO H. A. F., Sociedade Brasileira: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 49ª Ed. São Paulo: Global 2004.

GOMES, M. P., Os indios e o Brasil, Petrópolis, Vozes, 1988.

GORENDER, J., O Escravismo Colonial, 4ª ed., São Paulo, Atica, 1985

MONTEIRO J. M., Negros da Terra. Letras, São. Paulo,1994

MOURA, C., Rebeleiões da Senzala, 3ª ed., São Paulo, Ciências Humanas, 1981

PRADO JUNIOR, C., Evoluçao politica do Brasil, 6ª ed., São Paulo, Brasiliense, 1969

POMBO, R., Historia do Brasil, 14ª ed., São Paulo, Melhoramentos, 1967

SCHWARTZ, S. B., Segredos internos Engenhos e escravos na sociedade colonial, São Paulo, Companhia das Letras, 1988

SIMONSEN R. C., História econômica do Brasil 1500-1820, tomo 1. São Paulo, Companhia editora Nacional, 1937. VAINFAS, R., Ideologia e escravidão – Os letrados e a sociedade escravista no Brasil colonial, Petropolis, Vozes, 1986

VIANNA B. A. - MARIA R. L., Dicionário histórico Brasil. Colônia e Império. Dimensao, 2007

VICENTE S., História do Brasil 1500-1627. Melhoramentos, 1965


ROBSON FERNANDO CORRÊA LEITE