MARCHETTI JOSÉ (I). Sua vida no contexto do Brasil

De Dicionário de História Cultural de la Iglesía en América Latina
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(Lombrici, 1869; São Paulo, 1896) Sacerdote, Humanista

INTRODUÇÃO

Pe. José Marchetti, nascido em 1869. em Lombrici. Camaiore. na provincia de Lucca. ordenado em 1892. chegou pela primeira vez ao Brasil. com 25 anos. a 15 de outubro de 1894. passando pelo Rio de Janeiro e por Santos e re tornando ã Italia. Dois meses depois, estava de volta. desembarcando em Santos, a 26 de dezembro e subindo a Serra do Mar de tremo para a cidade de São Paulo, principal local de sua atividade humana e sacerdotal e onde viria a falecer dois anos depois, a 14 de dezembro de 1896 .[1]

O presente estudo pretende traçar, em rapidas pinceladas, o contexto em que se deram os trabalhos, fadigas e alegrias de sua breve existència apostolica"[2]. O Pe. Marchetti chegou ao Brasil no momento das mais rapidas e profundas rnodificaçòes de sua historia, tanto no campo demografico. quanto no economico, politico, social, mas igualmente no culturai e religioso. Desdobraremos. assim, nosso estudo em quatro seçòes:

  1. Transformaçòes no pais, no estado de São Paulo e em sua capitaI;
  2. Mudanças na Igreja;
  3. Desafios humanos e pastorais novos:
  4. Iniciativas do Pe. José Marchetti: o pobre, o orfão, a viuva.


1. Transformaçiies no Pais, no Estado de Sao Paulo e em sua capital

1.1. Transforrnaçòes no Pais

Elas foram profundas, no que tange ã transição de um regime de trabalho escravista, que ja durava peno de quatro séculos, para o de trabalho "livre", Essa transição estava inserita ja nos compromissos assumidos com a Inglaterra para o reconhecimento da independència do pais em 1827 e foi consumada na lei de suspensão do trafico de 1831. Lei "para inglès ver", como diziam o povo e seus proprios autores, isto é, sem nenhum ãnimo de aplica-Ia efetivarnente. como tantas outras, que contrariavam os interesses das classes dominantes, todas elas escravocratas, mesmo no seio do partido liberal. Nunca se importaram tantos escravos, meio milhão, quanto nos 19 anos que medeiam entre a lei de 1831 e a nova lei Eusébio de Queiroz de 1850, que finalmente interrompeu o trafico. de si. ja proibido e ilegal.[3]

A brusca interrupção do trafico, que entre 1846 e 1849 ultrapassara a casa de cinquenta mil escravos por ano[4], colocou de maneira aguda a questão de um novo regime de trabalho para o pais e abriu o debate sobre as alternativas para o suprimento de mão de obra, capaz de acompanhar o ritmo da incorporação de novas terras tomadas acessìveis pela criação de estradas de ferro, ligando-as aos portos maritimos ou pela introdução da navegação a vapor, de modo particular no vale amazònico e na bacia do Parana, Paraguai, alcançando o interior do Mato Grosso, até sua capital Cuiabá.

Para substituir a mão-de-obra até então trazida da Africa, cogitou-se na importação de "coolies" chineses, que estavam sendo levados em grande quantidade para substituir os escravos nos engenhos de açucar da costa peruana ou nos engenhos de Cuba. A escolha fixou-se no imigrante europeu, ja instalado no sul do paìs, em pequenas propriedades, seja na região serrana do Rio de Janeiro, com os suiços de Nova Friburgo (1819), alemães, em Petrópolis (1844) e Teresópolis seja no Rio Grande do Sul, com os alemães de São Leopoldo (1824)[5], seja com as levas posteriores, desta vez incluindo italianos[6], e poloneses[7], a partir de 1875, que foram assentadas em Santa Catarina[8], Parana[9], São Paulo e Espirito Santo[10], sempre porém no regime de pequenos proprietarios, encarregados de assegurar o abastecimento de alimentos para o mercado interno.

Tratava-se agora, porém, de armar o fluxo de substituição da mão-de-obra escrava nas grandes propriedades agrícolas voltadas para a exportação. Ingente tarefa que supunha a substituição das linhas de comércio e navegação desde sempre estabelecida com a Africa e troca da classe social dos "negreiros" por uma outra categoria de agentes e propagandistas para atrair e convencer os novos candidatos a trabalhadores para tocar as lavouras de café. Supunha outra categoria de transporte que não os navios negreiros e instalaçòes de acolhida diferentes das dos tradicionais mercados de escravos, da Cafua de São Luis do Maranhão ao Valongo no porto de Santos. Implicava ainda na mudança de todo o arcabouço juridico e social do paìs e de mentalidades profundamente arraigadas na anterior estrutura escravista.

Essa relação direta entre abolição da escravatura e imigração de massa para substituir os escravos nas fazendas de café paulistas,

“[...] durante muito tempo geriu muitos aspectos da vida dos colonos italianos nas fazendas de café: desde os programas de introdução e a viagem até a coerção sobre o trabalhador livre, que o fazendeiro queria impor.

Subsidiando a viagem de imigrantes agricultores em familia, o governo da Provincia assegurava a vinda dos mais pobres, que dificilmente teriam condiçoes de repatriamento e de se estabelecer por conta propria. As viagens transoceãnicas em geral estavam muito aquém do que atualmente se considera direitos humanos: navios de imigrantes, ãs vezes, mais parecendo navios negreiros. A viagem de trem do porto de Santos até a Hospedaria de Imigrantes na cidade de Sao Paulo, não raro, lembrava o transporte de escravos, havendo noticias de vagoes serem fechados a prego ... A Hospedaria de Imigrantes, embora moderna e oferecendo certa segurança para o imigrante e sua familia, parecia um mercado de escravos, ja que muitos farendeiros agiam com mentalidade escravocrata, esquecendo-se que estavam contratando gente livre.

A não compreensão das necessidades do imigrante italiano, que veio ã procura de uma decente alimentaçao e habitação digna, com assisténcia religiosa, médica e juridica e escolas para os filhos é reflexo da escravidão. Se o filho de escravos não precisava de escolas, por que o do imigrante as exigia? Se as construçoes precãrias da senzala serviam para o escravo, por que não para o imigrante?

O fazendeiro de café custou a compreender, por exemplo, o sentido de familia, que o imigrante trouxe na sua bagagem cultural. Se antes ele determinava o que o filho ou a filha do escravo deviam fazer, agora encontrava resistència e os jovens abandonavam a fazenda ã procura de melhores oportunidades. Cartas com as reclamaçoes contra os fazendeiros não eram remetidas: se o eseravo não tivera direito, por que o imigrante o teria?

A mentalidade escravoerata também pode explicar a grita dos fazendeiros por sempre mais imigrantes, já que a oferta maior que a procura de braços garantiria salários baixos. Não era fácil acostumar-se ao pagamento de salario.[11]

Se olharmos para o país em seu conjunto, podemos observar una "modernização" difusa que atinge mesmo as regiòes mais tradicionais. Por volta de 1890, os antigos engenhos de açucar no nordeste começam a sofrer a concorréncia de modernas usinas tocadas a vapor e os carros de boi cortam os canaviais para abastecer não mais os bangüês tocados a boi ou a roda dagua, mas os vagoes da ferrovia, que transportam a cana para as usinas.[12]O algodão do sertão mineiro e nordestino torna o caminho do Rio São Francisco em gaiolas a vapor e faz o transbordo para o trem em Juazeiro, seguindo dali pelos trilhos até o porto de Salvador na baia de Todos os Santos.

Essa transição atingiu também as antigas relaçòes de trabalho, que regiam o relacionamento entre os livres pobres, agregados, moradores de favor e os donos de terra, nos interstícios da ordem escravista. A tentativa de converter essas pessoas em assalariados, por exernplo, nas lavouras de algodão e sua expulsão das terras, para a entrada das usinas no lugar dos antigos bangüês, trouxe uma grande inquietação no campo, que culminou com o movimento de Canudos[13], onde se concentraram os seguidores de Antonio Conselheiro.

Insegura, a Republica acossada por revoltas militares, pelo fortalecimento das tendèncias monarquistas e pressionada pelos grandes proprietãrios e politicos da Bahia, manchou-se de sangue nas campanhas genocidas contra Canudos, entre 1894 e 1897[14].

Essa modernização das atividades tradicionais. açúcar e algodão, destinado ã exportação e ã crescente industria tèxtil e sua inserção no novo ciclo de acumulação capitalista, comandada pela industrialização, pelo uso da maquina a vapor, das ferrovias e navegação a vapor, atinge mais de cheio os novos eixos econòmicos: a borracha no norte do pais e o café no sul.

A extração da borracha, irrisoria até os anos 70 do século XIX, ganhou impulso com as novas aplicaçòes do produto na confecção de seringas, Iuvas, botas, capas impermeaveis e sua aplicação na industria naval. A explosão do consumo aconteceu. porérn, com o seu uso na fabricação de pneumaticos para bicicletas e automoveis, a partir de 1890. Isto provocou uma corrida para o vale amazònico, região nativa da "Haevea Brasiliensis", de onde se extraía o latex. Embora acorressem para a região muitos estrangeiros, ingleses, alemães, norte-americanos, sirio-libaneses, estes se instalaram nas cidades, de modo particular nos portos de Belém e Manaus, controlando as firmas de exportação e importação, as famosas casas de aviamento, bancos, linhas de navegação, serviços portuarios e serviços urbanos de agua, esgoto, iluminação e transporte. O grosso da mão-de-obra recrutada inicialmente entre as populaçòes ribeirinhas, em sua maioria indios destribalizados, os tapuios, logo passou a vir das areas amazònicas adjacentes como o Maranhão e, em seguida, das zonas flageladas pela seca do Nordeste.[15]

Meio milhão de nordestinos, de modo particular, cearenses, intemaram-se na Amazònia brasileira entre 1877 e 1912, o auge da corrida da borracha, liquidado pela concorrència das plantaçòes inglesas na Malasia e francesas na Indochina. Entre 1901 e 1910, a borracha alcançou 28.2 do total das exportaçòes brasileiras, enquanto o café declinava de quase dois terços das exportaçòes, na década anterior, para 51.3 e os demais produtos tradicionais da pauta de exportaçòes brasileiras cafam a porcentagens extremamente modestas: açúcar (l ,2), cacau (2.8), algodão (2.1), fumo (2,4), couros e peles (4,3), mate (2,9). Na primeira década da ìndependència, entre 1821 e 1830, o açúcar representava 30.1 das exportaçòes; o algodao 20,6: o café 18.4; couros e peles 13,6 e a borracha O, 1%.[16]

O outro grande eixo de expansão econòmica era o café[17], que avançara, durante o império, com suas plantaçòes pelo vale do Paraiba fluminense[18]e depois paulista, arrastando consigo sempre mais e mais escravos, trazidos da Africa ou importados das outras Províncias, depois da interrupção do trafico ou ainda arrancados do ventre das escravas, numa tentativa desesperada de prolongar o regime escravista. Organizou-se para tanto, aqui no Brasil, por primeira vez, o criatério de escravos, por intermédio de familias escravas, estruturadas com este intuito ou pelo uso, cada vez mais especializado, de "escravos reprodutores", encarregados de pejar as escravas jovens.[19]

A agonia do regime escravista e a transição para o trabalho livre na grande lavoura, encontram-se magistralmente retratadas no estudo classico de Maria Emilia Viotti da Costa, "Da Senzala ã Colònia”,[20]ou ainda no trabalho de Robert Conrad, "Os ultimos anos da escravatura no Brasil”.[21]

1.2. Transformaçòes na Provincia e depois Estado de São Paulo

Os baròes do café, elevados ã nobreza pelo imperador, sobretudo no ocaso do império e no seu declinio como classe social, formavam o sustentaculo maior do império escravista, que ruiu com a abolição da escravatura em 1888 e que, por isso mesmo, desembocou diretamente na republica positivista e liberal de 1889. É, porérn, a conjunção de terras novas, tornadas acessíveis pela extensão dos trilhos, de café sem escravos e tropas de mulas, mas com ferrovias e imigrantes, que propiciou a saga cafeeira do oeste paulista, a partir da construção da estrada de ferro[22]São Paulo Railway, ligando Santos a Jundiai (1868) e a posterior expansão para o norte e o oeste, por intermédio da Mogiana, partindo de Campinas para Ribeirão Preto: da Paulista, avançando por Rio Claro até Itirapina, Iati e ultrapassando mais tarde o rio Tietè na direção de Bauru e da Alta Paulista; da Sorocabana em direção a Sorocaba, Botucatu, Agudos, Ourinhos e, por fim, Bauru, Alta Sorocabana e norte do Paraná. De Bauru, em 1905, partiu a estrada de ferro Noroeste do Brasil, demandando o rio Paraná, o Mato Grosso, Corumba ã beira do Rio Paraguai e a Bolivia.

É num estado de São Paulo em plena transformação que chega o Pe. José Marchetti na ultima década do século XIX. Essa transformação acontecia na hinterlândia, em terras novas, abertas pela primeira vez ã atividade economica, graças ã ferrovia, ao braço imigrante e a um produto, o café, do qual o Brasil chegou a deter 90 do comércio mundial, numa situação de virtua1 monopolio. Esta nova combinação de café com ferrovia e imigrantes aconteceu de modo eminente no Estado de São Paulo, criando uma verdadeira explosão demografica e uma inesperada onda de prosperidade, acompanhada igualmente de seu cortejo de exploraçao, miséria e violència, sobretudo no campo do trabalho.[23]A obra monumental de Taunay sobre o roteiro do café retrata o caminho percorrido pelo café e a civilização, que ele criou.[24]

Para esa segunda expansao cafeeira, sem escravos, a figura central e o imigrante italiano,[25]que começa a comparecer nas estatìsticas em 1875, para se transformar bem depressa na mais importante corrente imigratoria, embalada pela grande alta de preços do café entre 1886 e 1890, quando seu valor mais do que dobrou no mercado internacional e gela expansão do crédito ã lavoura nos primeiros anos da Republica.[26]

Alguns dados permitem colher a relevância da imigração italiana para as lavouras de café de São Paulo. Zuleika Alvim em sugestivo artigo, "O Brasil italiano",[27]indica que no periodo da grande imigração, entre 1870 e 1920, a lavoura cafeeira atraiu direta ou indiretamente 2,5 milhòes de estrangeiros para o estado de São Paulo, de um total de 4,5 milhòes para o país. O impacto demografico sobre o estado de São Paulo foi enorme.[28]Sua população no inicio do século [XIX] era de apenas 200 mil habitantes, situando-o no quinto lugar entre as provincias. Em 1872, ãs vésperas da grande imigração, continua na quinta posição, com 837.354 habitantes, precedido por Pernambuco (841.539), pelo Rio de Janeiro (1.094.576), pela Bahia (1.379.616) e Minas Gerais (2.039.735).

No censo de 1890, São Paulo ja havia superado Pernambuco e, em 1920, ao final da grande imigração ocupava a segunda posição, com 4.492.000 habitantes, superado apenas por Minas Gerais (5.888.000).[29]Os italianos com cerca de 1.0 milhão de individuos representaram 40 de toda a imigração para o Estado de São Paulo. Houve momentos, entretanto, em que essa proporção cresceu consideravelmente, como, por exemplo, entre 1886 e 1896. Nesses dez anos, a Sociedade Promotora da Imigração introduziu no estado de São Paulo 480.896 imigrantes, dos quais 353.139 eram italianos, ou seja 73.43 do total.

Se dividimos a imigração italiana por décadas, entraram 49.927 imigrantes na década de 70; 276.724 na década de 80 e 690.367 na década de 90[30]. É nessa década, de transição do império para os primeiros anos da republica, em que entra uma verdadeira avalanche de italianos, que o Pe. Marchetti inicia seu apostolado pela capital e pelo interior do Estado de São Paulo, percorrendo as fazendas de café. No interior, estava em curso uma acelerada expansão das lavouras e, na capital, um surto de industrialização, pelo afluxo da riqueza cafeeira e pela crescente capacidade de consumo da população assalariada, de uma classe média em ascensão e do rapido enriquecimento dos fazendeiros, comerciantes, bancos e firmas ligadas ao comércio do café, ã implantação das ferrovias e ã modernização da cidade.

Junto com o crescimento e enriquecimento da cidade, acumu-lavam-se todos os problemas sociais e humanos de "deficit" e precariedade das moradias em cortiços e favelas, que as vilas operarias nao conseguiam eliminar;[31]de exploração do trabalho, até então sem nenhuma legislação de regularnentação e proteção dos trabalhadores e sem sindicatos legalmente constituidos; de abuso do trabalho infantil e feminino, em longas jornadas e mesmo em horarios noturnos nas industrias téxteis, de panificação e outras; de falta de escolas, de saneamento basico, assistència sanitaria, fazendo com que epídemias de tifo,[32]variola,[33]febre arnarela,[34]grassassem facilmente pela cidade, ceifando vidas, destruindo famílias e deixando muitas crianças órfãs e abandonadas. O fenomeno de meninos de rua e da prostituição infantil não são fenòmenos de hoje e estavam disseminados, infelìzmente, também na São Paulo de fins do século XIX, Pe. Marchetti observava a esse respeito:

"A Congregação quer manter a moralidade, a fé, a instrução, etc. Atualmente, o perigo está em toda parte, mas de modo particular em São Paulo, nas cidades, por causa dos órfãos, dos abandonados, dos marginalizados. Desta classe pegam as jovenzinhas para encher os cafés, etc. etc...[35]

1.3. Transformaçòes na cidade de São Paulo

Os primeiros impactos da modernização do país, a partir da segunda metade do século XIX, aconteceram no distrito da corte, a cidade do Rio de Janeiro. Ali chegaram por primeiro as novidades como os navios a vapor, a estrada de ferro, a iluminação a gas e depois elétrica, os bondes urbanos puxados por burros e, posteriormente, movidos a eletricidade, os primeiros automoveis e o primeiro fluxo imigratorio urbano, constituído principalmente por portugueses, mas também por ingleses, franceses, espanhois, sìrio-libaneses, alemães, norte-arnericanos. João Evangelista de Souza, o Barão de Maua, foi o responsavel por boa parte destas novidades e pelo impulso industrial da cidade do Rio de Janeiro.[36]Mas, bem depressa, a cidade de São Paulo tornou-se o simbolo das transforrnaçòes por que estava passando o país e o polo irradiador destas mudanças. Em nenhum outro lugar do país a profundidade e a extensão das transforrnaçòes foi mais visível[37].

O pequeno burgo colonial estava espremido no triãngulo formado pelo Convento do Carmo, sobranceando a várzea do rio Tamanduatei; o Mosteiro de São Bento, a cavalo entre o Tamanduateí e o riozinho Anhangabaú, e o convento São Francisco a montante do vale do Anhangabaú. Só timidamente, avançara, durante boa parte do periodo imperial, em direção aos campos do Guará ou da Luz, onde no século XVIII, Frei Galvão erigira um Recolhimento de Religiosas contemplativas.

So mesmo a instalação da Faculdade de Direito, em 1828, nos locais do Convento de São Francisco, viera agitar a placidez das noites da cidade com a algazarra dos acadèmicos e de suas republicas e a circulação de seus jornaizinhos mordazes, satiricos ou revolucionarios, pregando a abolição da escravatura e a substituição da monarquia pelo regime republicano[38].

Apenas a chegada da Estrada da Ferro, iniciada em 1860 e inaugurada em 1867, viera romper o secular isolamento da vila e depois cidade, ligada ao litoral por quase très séculos, pelo "carninho do padre", vereda transitavel unicamente a pé, em tempo seco, pelas íngremes subidas da Serra do Mar ou, mais tarde, pela Calçada de Lorena, construida pelo Morgado de Mateus, ao final do século XVIII. O novo caminho permitia o uso de mulas. Tropas de muares começaram a circular, subindo e descendo penosamente a serra, mas escrutando o céu, para ver se não ia chover e esperando não cruzar, ao descer, com outra tropa subindo pelo estreito caminho que, so em poucos lugares, permitia a passagem simultanea de dois animais.

Ao censo de 1872, São Paulo era ainda uma cidade acanhada, com 31.385 habitantes, regulando com Manaus, Florianopolis, Maceio, João Pessoa mas superada por São Luis do Maranhão (3l.664), Cuiaba (35.967), Fortaleza (42.458), Porto Alegre (43.998), Belém (6l.997), Recife 016.671), Salvador (129.109) e Rio de Janeiro (274.972), cuja população era nove vezes maior do que a paulistana.

A explosão viria nos anos seguintes, quando a capita1 se tornou o ponto de chegada de todas as ferrovias do interior" [39]e o caminho obrigatorio para o escoamento da produção cafeeira, que partia serra abaixo, num sistema de cremalheiras, enquanto, do porto de Santos, subiam imigrantes e mercadorias importadas, para redistribuição por toda a hinterlândia.

Pela «The São Paulo Railway Company» subiu o Pe. Marchetti para seu primeiro encontro com a cidade de São Paulo, no trem que, para os imigrantes, ja fazia uma parada direta na estação privativa da Hospedaria dos Imigrantes, no bairro do Bras, antes de chegar na antiga Estação da Luz, construida em 1865 e substituída pela nova, em 1900.

A cidade pacata entrou em atividade febril com a inauguraçao da estrada de ferro e o surto industrial.[40]A população passou a crescer em ritmo geométrico, dobrando entre o censo de 1872 e o de 1890 e quadruplicando entre 1890 e 1900. Assim, a São Paulo de 1872 com seus 31.385 habitantes chegava a 64.934 em 1890, a 239.820 em 1900 e 579.033 em 1920.

Pe. Marchetti chegou a São Paulo, neste momento de maior expansão demografica da cidade, em toda sua historia, a década entre 1890 e 1900. Naqueles anos, a população estrangeira, formada em grande parte por italianos, superou largamente a população brasileira. Entre os operarios da industria, a proporção era ainda mais avassaladora em favor dos estrangeiros, ultrapassando os 90%.

Pe. Marchetti estava assistindo ã liquidação da velha cidade indigena e mameluca, construida em taipa de pilão, ao longo de trezentos e cinqüenta anos, e ao surgimento de uma nova cidade, em estilo italiano, francès e inglès, feita não mais de barro mas de tijolos pelas mãos dos "muratori" e mestres de obra italianos[41]. Era urna cidade também que escondia mal todo o abandono e desleixo em que soçobravam os bairros, onde se processava a expansão industrial e se multiplicavam as moradias dos operarios. Valha esta descrição de algumas ruas do Brás, no jornal da colonia italiana paulista, o "Fanfulla" de 14 de março de 1899:

Nessa rua (que levava da Rangel Pestana ao Gasômetro nota do autor) […] os animais quebram as pernas, os carros perdem as rodas e os viandantes afundam até a cintura, lançando imprecaçoes e blasfêmias [...]. Paciéncia, quando se tratam de ruas despovoadas, pelas quais se pode transitar em bonde ou não transitar. Muito pior quando isso acontece em ruas habitadas, nas quais ao limo, lixo, juntam-se as águas servidas e muitas outras coisas que não é licito nomear, mas que muitas pessoas acham certo depositar ou jogar das janelas.

Noutras ruas, as calçadas não existem e tanto em dias de chuva como em dias serenos as pessoas não podem transitar senão descalças, com as saias ou as calças levantadas até o joelho. Imaginai agora o cheiro de tais ambientes, onde várias vezes por dia entram pés tratados de tal forma, imaginai tudo o mais e tereis uma idéia mais ou menos exata do estado daqueles tugurios e do dano imenso, que disso deve necessariamente derivar para a saude publica.

Esta é a razão pela qual no Brás tém sede predileta e endemica, a escarlatina, a variola, as febres palustres, as febres tifoides e varios outros beneficios do Senhor [...]”.[42]

A cidade tornou-se também espelho de todas as correntes sociais e políticas então existentes. dos liberais concentrados em torno da faculdade de direito, da grande imprensa e do governo aos anarquistas[43]presentes nas fabricas e nos jornais operarios. Os bairros operarios estavam coalhados de antigos carbonarios, anarquistas e socialistas, cujos gobernantes, em suas terras de origen, estavam felizes em esvaziar cadeias públicas e em despachar estes politicamente indesejaveis misturados ã massa de emigrantes destinados ãs lides agrícolas.[44]Muitos deles eran, porém, artesãos, operarios, pedreiros, músicos, alfaiates, sapateiros, gráficos, invariavelmente fichados, nos consulados brasileiros, como trabalhadores agrícolas, a serem endereçados para as fazendas de café. Ãs vezes, sem nunca terem tido uma enxada nas mãos, escapuliam das fazendas, na primeira oportunidade, para tentar a vida na cidade, seja como artesãos independentes, seja como operarios ou operarias na industria.[45]

2. Mudanças na Igreja

A mais importante de todas era a dupla mudança no seu povo de fieis: em primeiro lugar, a grande massa de escravos tornava-se "livre" e saía dos nichos tradicionais, onde esteve amarrada e controlada: engenhos, fazendas, minas e em todos os serviços, artes e oficios das cidades, mas principalmente nas lides domésticas, que prendiam as mulheres escravas ã cozinha, ao tanque, ao ferro de passar e engomar, ao cuidado das crianças brancas, ã costura e ã limpeza das casas.

No capitulo das lides dornésticas, pouca coisa mudou para as mulheres nesta transição, mas os homens, ao sairem das fazendas para as ciudades, encontraram enorme dificuldade de inserção no mercado de trabalho agora inundado por imigrantes estrangeiros. Para eles, sem terra para trabalhar e sem qualificação para se empregarem, não havia mais lugar na nova ordem capitalista e de trabalho "livre" e concorrencial, que se implantava.[46]

Em segundo lugar, era todo um povo novo que estava chegando: alemães, suíços, espanhóis. Italianos, russos, ucranianos, libaneses, japoneses,[47]alterando o panorama religioso em geral, com a diversificação das religiões e também das igrejas e confissões cristãs. Alterava-se igualmente o tradicional rosto do catolicismo brasileiro, o do catolicismo moreno, como o chama Eduardo Hoornaert,[48]fruto de forte miscigenação nos quase quatro séculos anteriores, em que indigenas, portugueses e negros foram se amalgamando e criando o povo brasileiro e seu singular catolicismo, que tanto espantou missionarios e imigrantes em fins do século passado. Agora o catolicismo conhecia, por primeira vez, o rosto de católicos orientáis, o de russos e ucraínos das igrejas unidas, mas também o dos melquitas e maronitas do Oriente Médio, conhecia igualmente tradições diferentes quanto à piedade e devoções de fora da peninsula ibérica: a de poloneses e alemães, de tiroleses e italianos.

Esse povo novo articulava-se também de maneira nova: nas colônias de pequenos proprietarios, era a cafela o nucleo em torno ao qual se desenrolava toda a vida religiosa.[49]Nas cidades, no lugar das antigas irmandades, confrarias e ordens terceiras, passam a florescer as associações de leigos e leigas, surgidas em grande parte na segunda metade do século XIX: o Apostolado da Oração, as Congregaçòes Marianas, as Filhas de Maria, as Ligas de Jesus, Maria e José e muitas outras. A familia, instituição chave entre os imigrantes o tanto mais que o governo privilegiava a imigração de famílias tanto para as lavouras de café, quanto para os lotes coloniais, passa a ter um papel nunca anteriormente conhecido na realidade de escravos sem família e de senhores que, ao lado de sua família legitima, multiplicavam filhos fora do casamento e mantinham uma ou mais concubinasso.[50]

A Republica, por sua vez, trouxe com o decreto 119 A de 7 de janeiro de 1890 a separação entre a Igreja e o Estado. Séculos de convivència entre as duas instituições, sob o instituto do Padroado Régio, haviam moldado habitos e criado um acomodamento eclesial, no campo pastoral, por ser o catolicismo a religião oficial do Estado e a unica autorizada a praticar o culto publico. Levara também a uma subordinação eclesiastica ao poder e arbitrio do Estado, pois este indicava os bispos e parocos e era responsavel por sua manutenção.

A oposição dos bispos, após o Concílio Vaticano I à presença da maçonaria nas irmandades religiosas levou a um confronto com o Estado, fazendo estalar a assim chamada "Questão Religiosa", que culminou com a condenação e prisão, em 1872, dos bispos de Olinda¬Recife e do Grão Para, Dom Frei Vital Maria Gonçalves de Oliveira (1871-1878) e Dom Antònio de Macedo Costa (1850-1890). No dizer do Pe. Júlio Maria. o episódio foi urna reação efémera, apenas um sobressalto de altivez e resistência à secular submíssão ao Estado, logo esquecido.[51]

A separação entre a Igreja e o Estado trouxe a liberdade de cultos, o fim dos subsidios do Estado aos professores dos seminarios e da "còngrua" paga aos parocos, cônegos e bispos. Por pequenos que fossem esses proventos vindos do Estado, não foi tarefa facil encontrar, de imediato, entradas para o sustento da mesa episcopal, da curia diocesana, dos seminarios, casas paroquiais e para os gastos do culto e da manutenção de tantas igrejas, capelas, missões e obras de caridade. O fim do clero secular como funcionario do Estado coincidiu com o seu colapso e rapida substituição por religiosos. que podiam contar com suas obras. colégios e hospitais. para assegurar o seu sustento, quando não com o apoio de suas ordens e congregaçòes no exterior, pelo menos para o periodo inicial de instalação.

Para aquilatar essa transição tão brusca no clero brasileiro, basta colocar lado a lado os dados do censo de 1872, limiar da grande transformação e o de 1920. Em 1872, a população do país alcançava 9.930.478 habitantes, o clero secular compunha-se de 2.256 (95.5) sacerdotes e o clero religioso de 107 (4.5) membros. As religiosas eram apenas 286 em todo o país.[52]A média de habitantes por padre, era de 4.202. Vale lembrar que os sacerdotes seculares eram praticamente todos brasileiros, assim como o clero religioso, com raras exceções.

No Censo de 1920, a população era de 30.642.041 habitantes, tendo mais do que triplicado entre os dois censos. No que concerne ao panorama dos efetivos religiosos, os dados não são de todo comparaveis, pela mudança de critérios na sua coleta. Os resultados, entretanto, deixam claro uma radical modificação, quando se examinam as tabelas do número de religiosos por nacionalidade e por sexo.

A primeira surpresa é o florescimento da vida religiosa feminina. Seu número multiplica-se por dez, somando quase 3.000 irmãs, sendo 1.761 (59,8) brasileiras e 1.181 (40.1) estrangeiras. O que impressiona é a rapida nacionalização dos efetivos, pois as congregações femininas, que ingressaram no Brasil, vieram em sua grande maioria da Europa: das 98 ingressadas nos cinquenta anos entre 1881 e 1930, 76 são estrangeiras e apenas 22 brasileiras, em grande parte fundadas entre 1911 e 1930 (12/22).

No que concerne aos homens, o movimento é inverso. Enquanto em 1872, quase todo clero é secular e brasileiro, em 1920, os estrangeiros são 2.838 (46.8) e os brasileiros 3.218 (53.1), dando um total de 6.059 pessoas. Como o censo não distingue entre clero secular e religioso e, no caso dos religiosos, entre irmãos leigos e sacerdotes, fica dificil extrair uma figura exata desta repartição. Pode-se, porém, dizer que boa parte dos efetivos do clero secular corresponde a sacerdotes brasileiros, enquanto a maior parte dos religiosos são formados por estrangeiros.[53]

O censo foi realizado logo após o término da grande guerra de 1914 a 1918. Essa representou um sinal de alerta para as congregaçòes missionarias, que dependiam inteiramente do exterior para a reposição e aumento dos seus efetivos. E las viram a guerra dificultar os contatos e o apoio às suas iniciativas no Brasil. Muitas começaram a abrir, a partir deste momento, noviciados e seminarios aqui no Brasil, quase sempre nas zonas de imigração européia do sul do país. Assim jesuitas alemães recrutavam vocações para seu seminario em São Leopoldo entre as familias de origem alemã do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina; os capuchinhos italianos entre as familias de origem veneta na serra gaúcha ou no interior paulista; os franciscanos. instalados em Santa Catarina e Petròpolis, durante muito tempo so recrutaram entre os co1onos alemães, suas vocações. Os carlistas farão o mesmo, buscando suas vocações entre os colonos italianos do sul.

A outra transformação visível na Igreja é o imediato fracionamento das antigas dioceses. Quase todas as dioceses e prelazias brasileiras tinham sua origem no periodo colonial: Sa1vador da Bahia (1550), Rio de Janeiro (1676), Olinda (1676), São Luìs (1677), Belém (1713), São Paulo (1745), Mariana (1745), Cuiabá (1745), Goiás (1745). Mais de cem anos depois, são criadas as novas dioceses do periodo imperial: Diamantina (1854), Fortaleza (1854) e Porto Alegre (1858).

Em que pese a população ter quase triplicado durante o século XIX, a politica imperial foi muito restritiva em dar à Igreja instrumentos mais ageis para o exercicio de sua tarefa pastoral, criando dioceses e paroquias a conta-gotas, para não onerar as finanças do Estado, responsavel pelo sustento do aparato eclesiastico. A Igreja em contrapartida, assumia, ao lado de seus encargos pastorais, tarefas civis, como a manutenção dos registros de nascimentos, via batizados, dos casamentos e obitos, o cuidado dos cemitérios, o da realização das eleições, que aconteciam normalmente na propria igreja, desempenhando o paroco as funções de juiz eleitoral e de secretario para a contagem e ata final dos resultados.

Quando da lei de terras de 1850, foram também os vigarios os encarregados, nas paroquias do interior, de lançar os registros de propriedade fundiária pelo país afora. Foram também eles os encarregados dos registros dos ingénuos, isto é, dos filhos de mulheres escravas nascidos depois de 28 de setembro de 1871, que seriam beneficiarios da Lei do Ventre Livre, quando completassem 21 anos de idade. Como se vè, nenhuma dessas crianças gozou do beneficio da lei, visto que, a abolição chegou antes, em 1888, quando a lei produziria os primeiros livres, so em 1892!

Nos primeiros anos da Republica, a Santa Sé ira apressar-se em dotar o país de uma re de mais ampla de dioceses, criando, de imediato, novos bispados em muitas das capitais dos estados: Manaus (1892), Paraíba (1892), Niterói (1892), Curitiba (1892), Maceió (1900), Vitoria (1895), e elevando Rio de Janeiro (1892) à Arquidiocese. Petropolis (1897) foi criada diocese no lugar de Niterói, capital do Estado do Rio. Petropolis havia sido residència de verão da corte, da nunciatura e do corpo diplomatico e, posteriormente, dos governos republicanos com o intuito de oferecer uma alternativa serrana à canicula do Rio e sobretudo um refúgio contra os surtos de febre amarela que dizimavam a população nos meses de chuva e calor do verão carioca.

Assim, pois, num unico ano, o de 1892, foram criadas mais dioceses do que entre 1745 e 1892. Nesse ano, foram erigidas 4 dioceses enquanto ao longo dos 147 anos anteriores, apenas tres o haviam sido: Diamantina, Fortaleza e Porto A1egre.

Quanto à febre amarela, esta não ficou restrita aos portos, pois os trens encarregavam-se de transportar para o interior pessoas contaminadas, disseminando rapidamente a epidemia, a cada veraõ.[54]O mesmo acontecia com a variola, até que as campanhas de vacinação de Oswaldo Cruz começassem lentamente a erradica-las dos portos e demais cidades litorâneas, foco de contaminação para o interior do país. Pe. Marchetti será uma das vitimas destes surtos não de febre amarela ou de variola, mas do tifo. Tendo contraido a doença em viagem apostólica pelas fazendas do interior paulista, mal teve tempo de retomar à capital para falecer ao lado do Orfanato Cristoforo Colombo. por ele edificado.

A criação dessas dioceses levou seus bispos a empenharem-se em trazer da Europa novas congregações religiosas tanto femininas como masculinas, acelerando o movimento de vinda de religiosos estrangeiros para o Brasil, com o intuito de cobrir as novas necessidades pastorais e os novos campos de trabalho abertos nestes bispados. As Congregações foram responsaveis pelo multiplicar-se de escolas, colégios, hospitais, orfanatos, asilos e outros tipos de obras sociais.[55]

3. Desafios pastorais novos

No documento preparatorio, que resultou na Pastoral Coletiva de 1890, a primeira na história do país, Dom Macedo Costa apresenta como um dos seus principais desafios pastorais, uma situação até então desconhecida: a avalanche de imigrantes, que aportavam ao país e, particularmente, a São Paulo, acompanhada pela dificuldade de a igreja local prestar-lhes um valido serviço:

“A colonização no Brasil por meio de imigrantes europeus, sempre favorecida pelo governo, tem tomado nos últimos anos, e cada vez mais ira tomando, grande desenvolvimento. A maior parte destes colonos são católicos e em grandissimo numero italianos, que recebem uma educação religiosa bastante alimentada de pias práticas, nas suas terras natais. Em geral, são de bom proceder, laboriosos, parcos, doceis e respeitosos; habituados a frequentar a igreja, à recepção dos Sacramentos e ao exercicio de especiais devoções. Chegados ao Brasil e dirigidos ou aos grandes nucleos coloniais, ou às fazendas, não acham mais aquela maneira de viver em seus países. Baldos de escolas e dos cuidados dos país, de todo ocupados no trabalho para viverem, crescem os meninos quase abandonados a si mesmos sem a educação religiosa. Os bispos fazem o que podem; mas a deficiência de sacerdotes, que nem para os nossos compatriotas chegam, os impede mais ou menos de virem em socorro aos colonos”.[56]

Certas ajudas, por outro lado, mais atrapalhavam do que auxiliavam, como insinuava a mesma memória: “O grande flagelo das dioceses, principalmente do sul, vem de padres estrangeiros, principalmente italianos, um ou outro dos quais vira para ca movido do zelo das almas, quase todos, porém, vém para ganhar dinheiro ou levar vida escandalosa, muitas vezes para um e outro fin”.<ref>Ibidem, p. 58.

Essa mesma preocupação expressa Dom Joaquirn Arcoverde, bispo de São Paulo, diretamente a Dom Scalabrini: “Abbia V. Ex. una gran cura nello scegliere buoni sacerdoti, altrimenti arrivati qua si rovinano abbagliati dal denaro”.[57]

Dom Macedo recomendava a vinda dos padres palotinos, com apoio da Santa Sé. De fato, eles ja haviam vindo, em 1886, a pedido dos colonos italianos de Vale Vèneto no Rio Grande do Su1.[58]Nesse momento, muitas outras congregações religiosas européias, tanto masculinas como femininas, com o fim das restrições impostas pelo Império e não renovadas pela República, estavam vindo para o Brasil. Algumas delas foram chamadas, como os Palotinos e os Basilianos, para ocuparem-se dos imigrantes de seus países. Nenhuma delas, porém, havia sido fundada, como serão os Carlistas, com o fito primeiro de dedicar-se inteiramente aos imigrantes.

De modo particular, chegam ao Brasil, entre 1890 a 1899, oito novas congregações religiosas masculinas, sendo duas da Espanha, uma da França, duas da Holanda, uma da Alemanha, uma da Bélgica e outra da Ucrània. Entre essas, estão a dos Redentoristas holandeses trazidos, em 1893, por Dom Silvério Gomes Pimenta, bispo de Mariana, para Minas Gerais e os redentoristas alemães por Dom Lino Deodato para São Paulo, em 1894; a dos Missionãrios Filhos do Coração Imaculado de Maria, ou mais simplesmente Claretianos, vindos da Espanha para Santos - SP, em 1895; a dos Verbitas alemães, em 1895, para o Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo; a dos Irrnãos Maristas franceses, em 1897, para Minas Gerais. Os Premonstratenses belgas chegam a São Paulo, em 1896; os Basilianos vindos da Galícia Austriaca ao Paraná, em 1896, acompanhando a imigração ucraniana para aquela região; Agostinianos Recoletos da Espanha vêm para Uberaba, MG, em 1899.

A realidade, porém, era mais complexa, como a da vinda fracionada de representantes de diferentes provincias da mesma ordem. É o caso dos capuchinhos italianos que chegam, via Bolívia, para o trabalho entre os indigenas da Amazònia brasileira, em 1869[59], mas que, nos albores da república, multiplicam sua presença: em 1893, a missão da Bahia é entregue à Provincia Picena ou de Ancona; a missão do Maranhão à Provincia de Milão, em 1891: a missão de Pernarnbuco, entregue em 1892 à Provincia Milanesa, passou em 1897 à Provincia de Napoles: Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espirito Santo foram assumidos em 1897, pela Provincia de Siracusa. O Rio Grande do Sul foi confiado à Provincia Francesa da Sabóia, em 1895. Os de Trento vieram para São Paulo em 1889.

Houve ainda a recuperação de algumas das antigas ordens coloniais, na primeira década da República: as provincias franciscanas de Santo Antònio, no norte e da Imaculada Conceição, no sul, são restauradas pelos franciscanos alemães da Saxònia, em 1891. A Ordem Beneditina iniciou sua restauração em 1895, por intermédio da Congregação de Beuron na Alemanha, com monges vindos de la da Baviera, mas também da Abadia de Maredsous, uma sua filial na Bélgica.[60]Os Carmelitas da Antiza Observãncia comecaram a ser restaurados pelos Carmelitas Espanhois em 1894.[61]

Essas vindas numerosas de religiosos, mesmo acompanhadas da chegada, inusitada no contexto brasileiro de até então, de ainda mais numerosas congregações femininas (98 entre 1881 e 1930, sendo 16 apenas na década entre 1891 e 1900), deixaram em aberto muitos outros desafios pastorais além do trazido pelas imigrações.

Um primeiro, era o do crescimento das ciudades. Ja, abordamos o explosivo crescimento da capital paulista, mas este se repetia por toda a parte: os portos e as capitais cresceram com o aumento da atividade econòmica e do aparato administrativo do estado republicano. Ao longo das ferrovias nas regiòes cafeeiras, cresciam novas ciudades, como pontos de apoio comercial e de serviços à massa de imigrantes, que entravam para as fazendas de café. Essa urbanização era vista com desconfiança pelas autoridades eclesiasticas.

Nas cidades que se industrializavam e São Paulo era urna delas, ao lado do Rio de Janeiro, correntes anarquistas e socialistas empalmavam as agitações operarias, carregadas de fortes tintas anticlericais, herdadas dos conflitos trabalhistas dos países de origem dos imigrantes, de modo particular, Italia e Espanha, onde a Igreja era vista como uma aliada dos patrões e dos govemos reacionarios. Muitos destes lideres operarios haviam saido diretamente das prisões para o Brasil, onde continuaram sua trajetória de lutas sociais e politicas.

Dom Macedo Costa teme as cidades e ainda olha as zonas rurais como o celeiro de vocações sacerdotais e religiosas: “As vocações sacerdotais não se colhem nos grandes centros de população. E um fenomeno hoje em dia comum a quase todos os paises da Cristandade. Recrutam-se as boas vocações nas populações rurais, nas zonas interiores ainda mais ou menos preservadas do contagio da ma civilização”.[62]

Outro desafio era atender as populações isoladas do interior e cujo contato pastoral com sacerdotes era raro e intermitente, dependente de longas e penosas viagens seja de canoa pelos rios, seja a cavalo por caminhos impraticaveis. Na memoria ja citada de Dom Macedo Costa, este propòe que as dioceses fossem todas elas percorridas por missionarios. Acrescentava, entretanto: “A falta, porém, de operdrios evangélicos que se dediquem a trabalhar na vinha do Senhor, como também a deficiència de meios para sustentd-los, opoem grande dificuldade a tais missões”.[63]

Se as missões eram por um lado urna esperança e um meio eficaz para se superarem velhas deficièncias pastorais, elas suscitavam não poucos conflitos de jurisdição com os parocos das localidades, por onde passavam os missionarios. A situação agravava-se nos lugares, onde a barreira da lingua, de modo particular entre imigrantes recém-chegados, tornava o trabalho do paroco praticamente impossivel, devendo este fazer apelo a missionarios, que conhecessem a lingua dos imigrantes. Na hora, porém, dos acertos sobre os direitos de estola sobre batizados e casamentos havia não raro desavenças. As isenções que muitos missionarios recebiam e as amplas faculdades pontifícias de que vinham investidos para dispensar de impedimentos matrimoniais e outros que nem mesmo os bispos possuiam, criavam por vezes ciúmes e incompreensões.[64]

Pe. Marchetti bem cedo expressa suas preocupações como missionario a Dom Scalabrini: “Quanto à outra delicadissima coisa a ser combinada com os Bispos, isto é, a nossa independència em relação aos pdrocos nativos, em alguns lugares pode ser, em outros, não; justamente porque é uma hierarquia estabelecida e não se poderia altera-la, senão sob o risco de esterilizar nossa Missão. Mas não faltará também lugar para os nossos Missionários, porque justo aqui estão as imensas paroquias, onde eles podem ser vigários sem a necessidade de separação. Se nos tivéssemos tantos missionários que chegassem a sobrar, então poderíamos formar também novas paroquias. Contudo, a obra mais util dos nossos missionários me parece que é a verdadeira Missão. Partirão do Orfanato dois ou tres Padres, irão a qualquer vicariado (sic), chamarão à igreja os colonos espalhados, algumas vezes converterão o vigário, regularizarão matrimãnios, batismos, cuidarão dos seus interesses materiais, levarão, se ali tiver, algum orfão e voltarão carregados de frutos, ao rumor das oficinas e ao fervor dos meus molequihnos”.[65]

Uma novidade, trazida pela Republica, foi a liberdade religiosa para todos os cultos e sua equiparação perante as autoridades civis. Esta situação nova abrira livre campo para o protestantismo de missão, vindo dos Estados Unidos e ja presente no país, desde meados do século XIX, ainda que em situação juridicamente diminuìda.[66]Sente-se da parte das autoridades católicas temor perante o quadro inusitado, em que à Igreja Católica haviam sido retirados privilégios e aos outros grupos religiosos oferecidas facilidades, de que até então não gozavam.[67]

Acrescente-se a isso, a nova fase republicana que abrigava, em muitas de suas correntes, não apenas a proposta de uma “igreja livre num estado libre” da agitação liberal, mas um laicismo militante, que desembocara na laicização dos cemitérios, do ensino público, dos estabelecimentos hospitalares, das forças armadas, tornando ainda obrigatória e prévia ao casamento religioso, a união civil. No alvorecer dos anos noventa, a igreja passava a enfrentar uma situação nova e desconhecida nos quatro séculos de sua anterior implantação no Brasil.

NOTAS

  1. Una pequena historia de sua vida foi publicada por FRANCESCONI, MARIO, Come lilla meteora - Padre Giuseppe Marchetti ( 1869-1896). Centro Missionario Scalabriniano. Piacenza. 1969. Cartas e outros docurnentos seus foram publicados por BONDI. Laura. Alguns escritos inéditos para evocar e aprofundar a figura de Padre José Marchetti. es. São Paulo. Loyola. s.d.: MELO-SONIA e Ivo PRATI, In memoriam - Padre José Marchetti - ( 1896-199fJ). Fotoprint. São Paulo, 1996. Escorços de sua vida, encontrarn-se na obra de Azzr. RIOLANDO. A Igreja e os Migrantes - voI. I: A imigraçado italiana e os principios da obra escalabriniana no Brasil ( 1888-1904). Paulinas. São Paulo. 19S7. pp. 153-169 e. em relação mais direta com o nascimento das Irrnãs Missionarias de São Carlos, in SIGNOR. LICE MARIA. João Batista Scalabrini e a Migraçiio Italiana - VIII projeto socio-pastoral. Pallotti, Porto Alegre, s.d. (1986?). pp. 159-202.
  2. Ao longo do trabalho. as citaçòes das cartas do Pe. Marchetti. quando não houver nenhuma ulterior indicação, forarn retiradas do livro de BONDI. LAURA. Alguns escritos ineditos para evocar e aprofundar a figura de Padre José Marchetti. es. São Paulo. Loyola. s.d. As citaçòes de outras cartas e documentos guardados no Arquivo da Provincia dos Carlistas em São Paulo. virão precedidas da abreviação AC (Arquivo dos Carlistas). Na maioria dos documentos. os italianos que vèrn para o Brasi!. na perspectiva do Pe. Marchetti, san tratados sempre como "emigrati", "ernigrantes". quando na perspectiva do pais que os recebe se trata de "imigrantes", Sempre que forern rnenciona¬das as pessoas. nesta ou naquela forma. estar-se-a conotando urna ou outra perspectiva.
  3. O melhor e mais completo estudo sobre o fim do trafico negreiro. continua sendo o de BETHEL. LESLIE. A Abolição do trdfico de escravos 110 Brasil. Editora Expressão e Cultura. Rio de Janeiro e EDUSP. São Paulo. 1976.
  4. A perspectiva do fim do trafico fez saltarem. drarnaticarnente, as figuras da irnportação (1845. J 9.453: 1846. 50.324: 1847. 56.172: 1848. 60.000: 1849. 54.061: 1850. 22.856: 1851, 3.287). provocando o bloqueio dos portos brasileiros pela esqua¬dra britãnica. captura e destruição de barcos negreiros e confisco de sua carga. Cfr. BETHEL. o. cit.. p. 368. para os dados estatisticos e cap. 12 para a crise final da abolição, pp. 309-365.
  5. Cfr. ROCHE,JEAN, A coloniração alemã no Rio Grande do Sul, t. I e II, Globo, Porto Alegre. 1969; MULLER, TELMO (org.), Imigração e Colonização Alemã - Anais do 3° Simposio da Imigração e Colonização Alemã no Rio Grande do Sul. 15-17 set. 1978. EST. Porto Alegre, 1980; FOUQUET, CARLOS, O imigrante alemão e seus descendentes no Brasil: 1808-1824-1974, Instituto Hans Staden, São Paulo, 1974. Para o conjunto da imigração atraída pela concessão de pequenas propiedades, cfr., OBERACKER IUNIOR, CARLOS. A coloniiação Baseada no Regime da Pequena Propriedade Agricola, in Sérgio Buarque de Holanda, Historia Geral da Civilitaçao Brasileira (HGCB), t. II, O Brasil Monarquico, vol. III, Reação e Transaçoes. DIFEL São Paulo, 1969, pp. 220-244.
  6. Os estudos mais abrangentes sobre a colonização italiana. encontram-se nos dois volumes patrocinados pela Fundação Giovanni Agnelli: BONI, LUIS A. DE, A Presença Italiana no Brasil, voI. I e II, EST, Porto Alegre e Fondazione Giovanni Agnelli, Torino, 1987 e 1990.
  7. BARRETO, MARIA THEREZINHA SOBIER SOBIERAJSKI, Poloneses em Santa Catarina, UFSC-Editora Lunardelli, Florianopolis, 1983; D’APREMONT, BERNARDlN e BRUNO DE GILLONNAY, Comunidades lndigenas. Brasileiras. Polonesas e Italianas no Rio Grande do Sud, UCS - Caxias do Sul, EST, Porto Alegre, 1976; WONSOWISKI, J. L., Nos Peraus do Rio das Antas - Nucleo de Imigrantes Poloneses da ex-Colonia Alfredo Chaves ( 1890), UCS, Caxias do Sul, EST, Porto Alegre, 1976.
  8. DALL' ALBA, JOAO LEONIR, Imigração Italiana em Santa Catarina – Documentario, EDUCS, Caxias do Sul, EST, Porto Alegre, Editora Lurnardelli, Florianopolis, 1983.
  9. BALHANA, ALTIVA PILATTI, "Italianos no Paranã", in DE BONI (org.). o. cit., pp. 120-143.
  10. ROCHE, JEAN, A Colonizaçao Alemã no Espirito Santo, DIFEL, São Paulo, 1968; CAVATI, JOÃO BATISTA, Historia da Imigração Italiana no Espirito Santo, Editora São Vicente, Belo Horizonte, 1973.
  11. PETRONE, MARIA THERESA SCHORER, Abolição e imigração italiana em Sáo Paulo, in BONI, Luis A. DE, A Presença Italiana no Brasil, vol. II, EST, Porto Alegre, Fondazione Giovanni Agnelli, Turim, 1990, pp. 325-326.
  12. Sobre as transformaçòes da produção açucareira no Nordeste, cfr. GUACCARINI, J. C., A economia do açucar. Processo de trabalho e processo de acumulaçao, in FAUSTO, BORIS, HGCB III-l, pp. 309-343: sobre as condiçòes de trabalho nas usinas a vapor, cfr. LOPES, JOSÉ SÉRGIO LEITE, O Vapor do Diabo - O trabalho dos Operários do Açúcar, Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1976.
  13. Para urna interpretação do conjunto dos movimentos sociais e religiosos que agitaram os sertòes nordestinos e as fronteiras entre Paraná e Santa Catarina, cfr. MONTEIRO, DOUGLAS TEIXEIRA, Um confronto entre Juazeiro, Canudos e Contestado, in FAUSTO. BORIS (coordenador), Historia Geral da Civilitação Brasileira III. O Brasil Republicano II. Estrutura de Poder e Economia (1889-1930), Difel, Sao Paulo, 1975, pp. 42-92; para o relato da guerra de Canudos, cfr. CUNHA, EUCLYDES DA, Os Sertòes, Cultrix, São Paulo, 1983³, ed. Cultrix; para um moderno balanço do significado de Canudos, cfr. LEYINE, ROBERT M ., O Sertao Prometido - O Massacre de Canudos, EDUSP, 1995. Sobre o aspecto mais diretamente religioso de Canudos, cfr. OLTEN, ALEXANDRE, Só Deus é grande - A niensagem religiosa de Antonio Conselheiro, Loyola, São Paulo, 1990.
  14. É interessante notar que o Pe. Marchetti, envolvido nas agruras e vicissitudes dos imigrantes italianos em São Paulo, ignora, totalmente, em sua correspondència, o drarna que se desenrolava na Bahia e para onde os principais jornais haviam despachado seus correspondentes. Nas paginas de "O Estado de São Paulo", Euclydes da Cunha publicava suas reportagens da guerra, convertidas depois no seu épico maior "Os Sertòes".
  15. Cfr. FURTADO, CELSO, O problema da nido de obra – III. A transumãncia amatonica, in A Formação Economica do Brasil, Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1969, pp. 137-143.
  16. PRADO. MARLA, LÍGIA COELHO e MARIA HELENA ROLIM CAPELANO, A borracha na economia brasileira da Primeira Republica, in FAUSTO, III/l, o. cit., pp. 285-307.
  17. Cfr. FURTADO, A Gestação da Economia Cafeeira, in o. cit.. pp. 118-124.
  18. Cfr. STEIN, STANLEY, Grandeza e Decadència do Café no Vale do Paraiba, Brasiliense, São Paulo, 1961.
  19. BEOZZO, JOSÉ OSCAR, A politica de reprodução da mão de obra escrava, in VOZES, LXXIV. jan./fev.1981, pp. 49-54.
  20. VIOTTI DA COSTA, MARIA EMILIA, Da Senzala ã Colonia, DlFEL, São Paulo,1966.
  21. CONRAD, ROBERT, Os ultimos anos da escravatura Ila Brasil, Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1975.
  22. Sobre a expansão paulista em direção ao oeste e noroeste do estado, cfr. MONBEIG. PIERRE, Pioneiros e fazendeiros de São Paulo, HUCITEC-POLIS, São Paulo, 1984 e, anteriormente AZEVEDO, FERNANDO DE, Um trem corre para u oeste, Obras Completas voI. XII, Melhoramentos, São Paulo. 2a ed. (s. d.).
  23. Sobre os contratos de trabalho na zona cafeeira e a imigração assalariada, cfr. HOLANDA, SÉRGIO BUARQUE, As colãnias de parceria, in HOLANDA, HGCB II/3, pp. 245- 260; PETRONE, TERESA SCHORER, Imigração Assalariada, ibidem. pp. 274-298. Sobre o motim dos colonos contra as condiçòes de trabalho na Fazenda Ibicaba. cfr. DAVATZ, THOMAS, Memorias de un colono no Brasil ( 1850), Livraria Martins, São Paulo, 1941.
  24. TAUNAY. AFFONSO DE E., Historia do Café no Brasil (XII tomos), DNC, Rio de Janeiro. 1939. Ha um resumo da grande obra, pelo mesmo autor: Pequena Historia do Café no Brasil, Rio de Janeiro, 1945.
  25. VANGELISTA, CHIARA, Le Braccia per la Fazenda - Immigrati e "caipiras" nella formatione del mercato di lavoro paulista (1850-1930), Franco Angeli Editore, Milano, 1982; HOLLOWAY, THOMAS H., Imigrantes para o café, Paz e Terra, São Paulo, 1984; GROSSELLI, RENZO M., Da Schiavi Bianchi a Coloni. Un progetto per le fazendas: Contadini trentini (veneti e lombardi) nelle foreste brasiliane, Parte IV, São Paulo 1875- 1914, Edizione a cura della Provincia Autonoma di Trento, 1991; CENNI, FRANCO, Italianos no Brasil - Andiamo in Merica ... 2ª ed. Facsimilar comemorativo do centenario da imigração italiana no Brasil, 1875-1975. Martins-EDUSP. 1975.
  26. Cfr. FAUSTO, BORIS, Expansao do Café e Politica Cafeeira, in FAUSTO, BORIS, Historia Gera! da Civilitaçtio Brasileira, III/1, o. cit., 193-248.
  27. ALVIM, ZULEIKA, O Brasil italiano (1880-1920), in FAUSTO, BORIS (organizador), Faier a America - A Imigraçtio em Massa para a America Latina, EDUSP, Memorial, FUNAC, São Paulo. 1999, pp. 383-417.
  28. BEIGUELMAN, PAULA, A Formação do Povo 110 Complexo Cafeeiro - Aspectos Politicos, Pioneira, São Paulo, 1977² (ed. Revista e aumentada).
  29. IBGE, Estatisticas Historicas do Brasil, Séries Econãmicas. Demogrdficas e Sociais de 1550 a 1985, Série Estatìsticas Retrospectivas, vol. 3, IBGE, Rio de Janeiro, 1987.
  30. Cfr. CENNI, o. cit., pp. 170-171.
  31. CARPINTERO, MARISA VARANDA TEIXEIRA, Imagens do Conforto: A Casa Operdria nas Primeiras Décadas do Século XX em São Paulo, in BRESCIANI, STELLA (org.), Imagens da Cidade - Séculos X1X e XX, ANPUH/São Paulo, Marco Zero Editora, São Paulo, 1994, pp. 123-146.
  32. O tifo rondou a obra apenas iniciada do Pe. Marchetti: "Nesses dias tivemos ocasião para meditar bastante sohre a morte. Minha irnui e lima outra pessoa de casa estive ram e ainda estão correndo perigo de morte: estdo com tifo. E que tifo!". Carta do Pe. J. Marchetti a Dom J. B. Scalabrini, São Paulo, 12-01-1896. Ao final deste mesmo ano, será a vez de o proprio Pe. Marcherti agonizar, atingido igualmente pelo tifo, que o levará ã norte, no dia 14 dezembro de 1896, aos 27 anos.
  33. BERTUCCI, LIANE MARIA, Uma ameaça Iminente - As Epidemias. Um momento: variola – 1908, in BRESCIANI, o. cit., pp. 77-91.
  34. Sobre a febre amarela, mas também sobre os fazendeiros, escrevia o Conde Gherardo Pio de Savoia a Dom Scalabrini, logo após a passagem do Pe. Marchetti pelo Rio de Janeiro: "Temos a fehre amarela e os farendeiros, dois flagelos que valem por quatro: a fehre amatela que muta e assusta: o fazendeiro que muitas vezes não possui nenluun sentimento cristão, habituado até ontem a golpear escravos [ ... ] nem a fehre amarela nem os fazendeiros se ocupam dos laços de familia; este ultimo, nes limites de seu poder, levando em conta seu interesse apenas, separa o que está unido e une o que está separado ... "; SAVOIA, GHERADO PIO, Lettera a Giovanni Battista Scalabrini. Rio de Janeiro 11-11-1894 (AGS. 356/2), citado por SIGNOR, o. cit., p. 162.
  35. Carta do Pe. J. Marchetti a Dom 1. B. Scalabrini, Sao Paulo, 10-03- 1895, p. 17.
  36. CALDEIRA, JORGE, MAUÃ, Empresdrio do Império, Companhia das Letras, Sao Paulo, 1995.
  37. GLESER, RAQUEL, Visoes de São Paulo, in BRESCIANI, o. cit., pp. 163-175.
  38. Imagens desta São Paulo antiga e de suas primeiras transforrnaçòes podem ser encontradas em SESSO JUNIOR, GERALDO, Retalhos da Velha Sao Paulo, OESP-Maltese, São Paulo, 1986² (Revisada); MOURA, PAULO CURSINO DE, São Pau/o de Outrora (evocaçoes da metropole), Coleção Reconquista do Brasil (Nova Série), vol. 25, Itatiaia, Belo Horizonte – EDUSP, São Paulo, 1980.
  39. MATOS, ODILON NOGUEIRA DE, Vias de Comunicução, in HOLANDA, HGCB II/4, pp. 42-59.
  40. Sobre a industrialização brasileira, a classe operaria e seus movimentos, mormente em São Paulo, cfr. DEAN. W ARREN,A industrialitação de São Paulo ( 1889-1945), DIFEL, São Paulo, 2ª ed. (s.d.); PINHEIRO, PAULO SÉRGIO e MICHAELM, HALL, A Classe operáia no Brasil ( 1889-1930), vol. I - O Movimento Operario, Editora Alfa Omega. São Paulo, 1979; A Classe operáia no Brasil - Condiçoes de l'ida e de trabalho, relaçoes com os empresários e o Estado (1889- 1930), vol. II - Documentos, Brasiliense, São Paulo, 1981; CARONE, EDGAR, Movimento Operário no Brasil (1877-1944), DIFEL, São Paulo, 1979.
  41. Uma fascinante descrição deste processo de destruição e reconstrução da cidade, primeiro de taipa, cidade indigena e mestiça que perdura até meados dos anos 70 do século XIX, depois de tijolos e européia entre 1880 e 1920 e, finalmente norteamericana, nos seus arranhacéus de ferro e cimento armado, encontra-se no livro de TOLEDO, BENEDITO LIMA DE, Sao Paulo: tres cidades em um século, Livraria Duas Cidades, São Paulo. 1981.
  42. PINHElRO, o. cit., vol. II, pp. 24-25.
  43. Cfr. MARAM, LESLIE SHELDON, Anarquistas, imigrantes e movimento operário brasileiro. 1890-1920, Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1979; DULLES, JOHN W. FOSTER, Anarquistas e Comunistas no Brasil, Ed. Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1977.
  44. TRENTO, ANGELO, Emigratione italiana e movimento operaio a São Paulo. 1890-1920, in ROSOLI, GIANFAUSTO (org.), CEISAL-ASSLA-USP, Emigrazioni europee e popolo brasiliano - Atti del Congresso Euro-Brasiliano sulle migrazioni (São Paulo. 19-21 agosto 1985). Centro Studi Emigrazione, Roma, 1987, pp. 229-256
  45. PETRONE, PASQUALE, A influéncia da imigração italiana nas origens da in-dustrialização brasileira. in DEBONI, o. cit., pp. 489-507.
  46. O melhor estudo sobre o negro neste periodo é de FERNANDES, FLORESTAN, A integração do negro na sociedade de classes, Dominus Editora e EDUSP, São Paulo, 1965 (2 vol.).
  47. NOGUEIRA, ARLlNDA ROCHA, Imigração japonesa na historia contemporánea do Brasil, Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, São Paulo, 1984.
  48. HOORNAERT, EDUARDO, O Cristianismo moreno do Brasil, Vozes, Petropolis,1991.
  49. GALIOTO, Pe. ANTONIO, O Significado das capelas nas colônias italianas do Rio Grande do Sul, in DE BONI, o. cit., pp. 293-312.
  50. Cfr. BEOZZO, JOSE OSCAR, A familia escrava e imigrante na transição do trabalho escravo para o livre, in MARCILIO, MARIA LUIZA, Familia, Mulher, Sexualidade e Igreja na Historia do Brasil, CEDHAL-CEHILA, Loyola, São Paulo, 1993, pp. 29-100.
  51. MARIA. Pe. JULIO, O Catolicismo Ila Brasil - Memoria Historica, Agir, Rio de Janeiro, 1950. pp. 179-204; Cfr. do ponto de vista de um historiador liberal, BARROS, ROQUE SPENCER M. DE, A questão religiosa, in HOLANDA, HGCB. II/4, pp. 338-365; para o julgamento em si, cfr. Processo e Julgamento do Bispo do Para. D. Antonio de Macedo Costa pelo Supremo Tribunal de Justiça (segundo a compilação feita para a Revista: O Direito), Typographia Theatral e Comercial, Rio de Janeiro, 1874; para o ponto de vista de Dom Antonio Macedo Costa: D. ANTÒNIO MACEDO, Resposta a seus acusadores na Câmara, Pará, 1879; A questão Religiosa do Brasil perante a Santa Sé. 1886; O Bardo de Missão Penedo e sua Missão a Roma, Rio, 1888; para um ponto de vista contemporaneo: VILLAÇA, ANTONIO CARLOS, Historia da Questão Religiosa no Brasil. Livraria Francisco Alves Editora. Rio de Janeiro. 1974.
  52. Diretoria Geral de Estanstica - Censo de 1872: Relatorio Anexo ao Ministério dos Negocios, Rio de Janeiro, 1876.
  53. Para maiores detalhes desta problematica, cfr. BEOZZO, JOSE OSCAR, Decadéncia e Morte. Restauração e Multiplicação das Ordens e Congregações Religiosas no Brasil: 1870-1930, in AZZI, o. cit., pp. 85-129.
  54. Em meio a uma de suas viagens ao interior de São Paulo, em região infestada pela febre amarela, escrevia Pe. Marchetti: "Sono 65 giorni che viaggio attraverso ai boschi e alla febbre gialla. Il buon Dio mi ha conservato sano e salvo. Apud FRANCESCONI, o. cit., p. 42.
  55. Para um quadro das obras mantidas por congregações italianas, veja, BEOZZO, JOSÉ OSCAR, O clero italiano no Brasil, in DE BONI, Luis A, A Presença Italiana no Brasil, EST - Fondazione Giovanni Agnelli, Porto Alegre – Torino, Vol. I, pp. 34-62.
  56. COSTA, MACEDO, Alguns pontos de reforma na Igreja do Brasil - Memoria para servir às discussoes e resoluções nas conferéncias dos Senhores Bispos, apud AZZI, RIOLANDO, Dom Antonio de Macedo Costa - Bispo do Pará, Arcebispo Primaz ( 1830- 1891), Cadernos de Historia da Igreja 1, Loyola/CEPEHIB, 1982, p. 65.
  57. AC - Carta de Dom Gioacchino (sic) Arcoverde a Dom Scalabrini, São Paulo. 18-02-1896.
  58. BONFADA, GENÉSIO, Os Palotinos IlO Rio Grande do Sul - 1886-1919: Fim da Provincia Americana, Impressão Pallotti, Porto Alegre, 1991.
  59. Cfr. BEOZZO, JOSE OSCAR, A Igreja e os Indios: 1875-1889, in BEOZZO, JOSÉ OSCAR (coordenador), Historia da Igreja no Brasil, t. II/2, Vozes, Petrópolis, 1980, pp. 296-307.
  60. Cfr. JONGMANS, JACQUES, A Reforma da Ordem Beneditina no Brasil (1890-1910), in AZZI. RIOLANDO (org.), A Vida Religiosa no Brasil - Enfoques Históricos, CEHILA/Paulinas, São Paulo, 1983. pp. 130-150.
  61. Para o conjunto destas mudanças no campo dos efetivos religiosos, cfr. BEOZZO, JOSE OSCAR, Decadéncia e Morte. Restauração e Multiplicação das Ordens e Congrega¬çòes Religiosas no Brasil: 1870-1930, in AZZI, o. cit., pp. 85-129.
  62. COSTA MACEDO, o. cit.. p. 62.
  63. Ibidem, p. 64.
  64. Para acompanhar as interrninaveis querelas e conflitos entre rnissionarios, vigarios e bispos, sirva de exemplo a odisséia dos primeiros carlistas junto aos colonos italianos do Espirito Santo: Azzi, o. cit., pp. 25-116.
  65. Carta de G. Marchetti a J. B, Scalabrini, São Paulo, 29-03- I 895, p. 22. Sobre o tema das missões, a Pastoral Coletiva ira recornenda-las para todas as paroquias, mas ao mesmo tempo submetendo os missionarios à autoridade dos Bispos, no que tange às faculdades, que cessarão ao término da missão. Impóem, rambém, limites estritos aos missionarios: “Mandamos que os Missiondrios não se envolvam no serviço paroquial, salvo o caso de serem para o mesmo convidados ou rogados pelos Revds. Párocos “. “Proibimos que, durante as Missões, os Missiondrios peçam esmolas. comutem votos e promessas em dinheiro, ou em quaisquer outros donativos para obras suas”. “Muito recomendamos aos Revds. Missionários que não se envolvam em questões politicas e locais”. Era uma tentativa de manter a paz entre parocos e missionarios e que os prirneiros não se sentissem desautorizados ou suplantados pelos missionarios ou afetados nos rendimentos paroquiais. Cfr. cap. 7 - Missòes. in Pastoral Collectiva dos Senliores Arcebispos e Bispos das Provincias Ecclesiasticas de S. Sebastião do Rio de Janeiro, Marianna, São Paulo, Cuvabá e Porto Alegre, Typ. Martins de Araújo, Rio de Janeiro, 1915.
  66. Sobre o Protestantismo de Missão. veja-se o trabalho pioneiro de LÉONARD, ÉMILE, O Protestantismo brasileiro, ASTE, São Paulo, 1963; REILY, DUNCAN, Historia Documentai do Protestantismo no Brasil, ASTE, São Paulo, 1984. MENDONÇA, ANTôNIO GOUVêA e PROCORO VELASQUES FILHO, Introdução ao Protestantismo no Brasil, Loyola-Ciència da Religião, São Paulo, 1990; HAHN, CARL JOSEPH, Historia do Culto Protestante no Brasil, ASTE, São Paulo, 1989; REILY, DUNCAN, Historia Documental do Protestantismo no Brasil, ASTE, São Paulo, 1984. Para o protestantismo de imigração, cfr, DREHER, MARTIN, Igreja e Germanidade. Estudo critico da Historia da Igreja Evangelica de Confissão Luterana no Brasil. Sinodal, São Leopoldo, 1984; Um esboço da Historia do Protestantismo no Brasil, in BEOZZO. JOSÉ OSCAR (org.), Curso de Verão - Ano III, CESEP-Paulinas, São Paulo, 1989, pp. 101-119.
  67. A preocupação com os protestantes é bem visìvel neste dialogo do Pe. Luìs Lasagna, superior dos salesianos no Brasil e colonos italianos instalados ao norte da cidade de San Paulo: "Apos ter renovado minhas saudações carinhosas, perguntei-lhes logo se tinham conservado intata sua fé, se não tinham acreditado nas imposturas dos ministros protestantes que, com frequéncia, aparecem entre eles para desorientá-los, se mantinham o costume da oração, se ensinavam o catecismo a seus filhos [ ...]”, in AZZI, o. cit., p. 123.


JOSÉ OSCAR BEOZZO